segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Zabala - As sequências didáticas e as sequências de conteúdo

 

      

AS SEQÜÊNCIAS DE ENSINO/APRENDIZAGEM OU DIDÁTICAS

Das diferentes variáveis que configuram as propostas metodológicas, analisaremos primeiro a que é determinada pela série ordenada e articulada de atividades que formam as unidades didáticas. Situamos esta variável em primeiro lugar porque é a mais fácil de reconhecer como elemento diferenciador das diversas metodologias ou formas de ensinar. Os tipos de atividades, mas sobretudo sua maneira de se articular, são um dos traços diferenciais que determinam a especificidade de muitas propostas didáticas. Evidentemente, a exposição de um tema, a observação, o debate, as provas, os exercícios, as aplicações, etc., podem ter um caráter ou outro segundo o papel que se atribui, em cada caso, aos professores e alunos, à dinâmica grupai, aos materiais utilizados, etc. Mas o primeiro elemento que identifica um método é o tipo de ordem em que se propõem as atividades. Deste modo, pode se realizar uma primeira classificação entre métodos expositivos ou manipulativos, por recepção ou por descoberta, indutivos ou dedutivos, etc. A maneira de situar algumas atividades em relação às outras, e não apenas o tipo de tarefa, é um critério que permite realizar algumas identificações ou caracterizações preliminares da forma de ensinar. Em qualquer caso, e como já dissemos no primeiro capítulo, o parcelamento da prática educativa em diversos componentes tem certo grau de artificialidade, unicamente explicável pela dificuldade que representa encontrar um sistema interpretativo que permita, ao mesmo tempo, o estudo conjunto e inter-relacionado de todas as variáveis que incidem nos processos educativos. Como tais, estes processos constituem uma realidade global que é totalmente evidente quando pensamos numa sequência de ensino/ aprendizagem sem, por exemplo, ter definido o tipo de relações que se estabelece na aula entre professores e alunos e entre os próprios meninos e meninas. Estas relações são fundamentais na configuração do clima de convivência e, por conseguinte, de aprendizagem. Mas acreditamos que a opção de começar pelas sequências se justifica se, tal como já mencionamos nos capítulos anteriores, levamos em conta a importância capital das intenções educacionais na definição dos conteúdos de aprendizagem e, portanto, do papel das atividades que se propõem. Desta forma, haverá uma grande diferença entre um ensino que considere conteúdo de aprendizagem, por exemplo, a observação dos fenômenos naturais, e o que situe num lugar de destaque as atitudes ou determinadas habilidades sociais, o que determinará um tipo de conteúdos, algumas atividades e, sobretudo, um tipo de sequência.

Podemos considerar que frente a um modelo geralmente expositivo e configurador da denominada aula magistral, surgiu uma diversidade de propostas nas quais a sequência didática se torna cada vez mais complexa. Não é tanto a complexidade da estrutura das fases que a compõem, mas a das próprias atividades, de tal forma que, esquematicamente e seguindo, a sequência do modelo tradicional, que ele denomina circuito didático dogmático, estaria formada por quatro fases:

a) Comunicação da lição.

b) Estudo individual sobre o livro didático.

c) Repetição do conteúdo aprendido (numa espécie de ficção de haver se apropriado dele e o ter compartilhado, embora não se esteja de acordo com ele), sem discussão nem ajuda recíproca.

d) Julgamento ou sanção administrativa (nota) do professor ou da professora.

Se bem que este modelo, tal como descreve Bini, normalmente não se dá de forma tão simples, constitui, sim, o ponto de partida, com variações significativas, de muitas das formas de ensino habituais. Se excetuamos a avaliação negativa que se pode deduzir da forma como se descreve a fase de estudo individual, certamente poderemos concluir que corresponde à sequência estereotipada do modelo tradicional expositivo.

O objetivo deste livro, como já dissemos, não consiste em avaliar determinados métodos, nem propor nenhum em conclusão, mas em pôr sobre a mesa os instrumentos que nos permitam introduzir nas diferentes formas de intervenção aquelas atividades que possibilitem uma melhora de nossa atuação nas aulas, como resultado de um conhecimento mais profundo das variáveis que intervêm e do papel que cada uma delas tem no processo de aprendizagem dos meninos e meninas. Portanto, a identificação das fases de uma sequência didática, as atividades que a conformam e as relações que se estabelecem devem nos servir para compreender o valor educacional que têm, as razões que as justificam e a necessidade de introduzir mudanças ou atividades novas que a melhorem. Assim, pois, a pergunta que devemos nos fazer, em primeiro lugar, é se esta sequência é mais ou menos apropriada e, por conseguinte, quais são os argumentos que nos permitem fazer esta avaliação.

Se adotarmos esta proposição sobre a sequência do modelo tradicional, também deveremos aplicá-lo a qualquer outra sequência, como a do modelo de "estudo do meio", que consta das seguintes fases:

a) Atividade motivadora relacionada com uma situação conflitante da realidade experiencial dos alunos.

b) Explicação das perguntas ou problemas que esta situação coloca.

c) Respostas intuitivas ou "hipóteses".

d) Seleção e esboço das fontes de informação e planejamento da investigação.

e) Coleta, seleção e classificação dos dados.

f) Generalização das conclusões tiradas.

g) Expressão e comunicação.

O que podemos dizer desta sequência além da constatação de sua maior complexidade? Vale a pena complicar tanto? Contribui para melhorar a aprendizagem dos alunos? Podem se acrescentar ou eliminar algumas atividades? Quais? Mas, sobretudo, que razões podemos esgrimir para fundamentar as avaliações que fazemos ou as decisões que tomamos? Que avaliação podemos fazer desta sequência e que razões a justificam?

Para poder responder a estas e outras perguntas, utilizaremos neste capítulo os referenciais básicos para a análise de quatro sequências correspondentes a quatro unidades didáticas exemplificadas, muito utilizadas e conhecidas por todos nós. Em primeiro lugar, depois da descrição de cada uma delas, analisaremos as diferentes concepções do ensino que as respaldam, utilizando os diferentes tipos de conteúdos como instrumentos para detectar as posturas que as fundamentam. Posteriormente, uma vez vistas as intenções de cada uma das unidades, comprovaremos que modificações e mudanças haveriam que introduzir para melhorar a aprendizagem, dos conteúdos. Para realizar esta análise utilizaremos as condições da aprendizagem significativa, o que nos obrigará a introduzir uma nova unidade de análise, a sequência de conteúdo, a fim de poder acompanhar os processos de ensino/aprendizagem segundo as características particulares de cada um dos diferentes tipos de conteúdos.

QUATRO UNIDADES DIDÁTICAS COMO EXEMPLO

Nos quatro exemplos de unidades de intervenção, poderemos observar um grau diferente de participação dos alunos, assim como a apresentação por parte do professor ou da professora de uma situação problemática relacionada com um tema

O professor ou a professora desenvolve um tema em tomo de um fato ou acontecimento, destacando os aspectos problemáticos e os que são desconhecidos para os alunos.

Como na unidade anterior, os conteúdos do tema c da situação que se coloca podem ir desde um conflito social ou histórico, diferenças na interpretação de certas obras literárias ou artísticas, até o contraste entre um conhecimento vulgar de determinados fenômenos biológicos e possíveis explicações científicas.

2. Proposição de problemas ou questões

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados pelo professor ou professora, expõem as respostas intuitivas ou suposições sobre cada um dos problemas e situações propostos

4.     Proposta das fontes de informação

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados peio professor ou professora, propõem as fontes de informação mais apropriadas para cada uma das questões: o próprio professor, uma pesquisa bibliográfica, uma experiência, uma observação, uma entrevista, um trabalho de campo.

5.     Busca da informação

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados peio professor ou professora, realizam a coleta dos dados que as diferentes fontes lhes proporcionaram. A seguir selecionam e classificam estes dados.

6.     Elaboração das conclusões

Os alunos, coletiva e/ou individualmente, dirigidos e ajudados pelo professor ou professora, elaboram as conclusões que se referem às questões e aos problemas opostos.

Generalização das conclusões e síntese

Com as contribuições do grupo e as conclusões obtidas, o professor ou professora estabelece as leis, os princípios que se deduzem do trabalho realizado.

8.     Exercícios de memorização

Os meninos e meninas, individualmente, realizam exercícios de memorização que lhes permitam lembrar dos resultados das conclusões, da generalização e da síntese.

9.     Prova ou exame

Na classe, todos os alunos respondem às perguntas e fazem os exercícios do exame durante uma hora.

10.   Avaliação

A partir das observações que o professor fez ao longo da unidade e a partir do resultado da prova, este comunica aos alunos a avaliação das aprendizagens realizadas.

Antes de continuar insistindo no que manifestei anteriormente, e para não fazer uma leitura com preconceitos contra ou a favor, faremos algumas considerações em relação a estes exemplos. Com estas representações não pretendo ilustrar nenhuma tendência nem, naturalmente, fazer avaliações tendenciosas. Uns mais, outros menos, todos temos utilizado, ou utilizamos, formas de ensinar relacionadas com alguma destas sequências. Como observaremos a seguir, todas elas podem ser válidas. Cada uma delas tem aspectos suficientemente positivos, daí que todas podem ter alguma utilidade. De qualquer forma, segundo quais sejam nossos objetivos, nosso conhecimento dos processos subjacentes à aprendizagem e o contexto educativo em que se realizam, nos daremos conta de que são incompletas. O que nos interessa desta análise é reconhecer as possibilidades e as carências de cada unidade, com o fim de que nos permita compreender outras propostas e reconhecer, em cada momento, aquelas sequências que se adaptam mais às necessidades educacionais de nossos alunos.

CRITÉRIOS PARA A ANÁLISE DAS SEQUÊNCIAS:OS CONTEÚDOS DE APRENDIZAGEM COMO EXPLICITAÇÃO DAS INTENÇÕES EDUCATIVAS

Um primeiro olhar nos exemplos propostos servirá para examinar se cada um deles pretende alcançar os mesmos objetivos. Assim, para a análise das sequências examinaremos, em primeiro lugar, os conteúdos que se trabalham, a fim de julgar se são os mais apropriados para a consecução dos objetivos.

• Se observamos o Quadro 3.1, veremos que os conteúdos da primeira unidade são fundamentalmente, conceituais. A técnica expositiva dificilmente pode tratar outra coisa que não seja conteúdos conceituais. Em todo caso, podem se expor modelos de realização do algum conteúdo procedimental, ou pode se fazer*

• Alguma avaliação sobre as atitudes de algum personagem. Mas o tratamento é basicamente conceituai. As habilidades que se trabalham (tomar notas, técnicas de estudo, síntese, memorização) não podem ser consideradas conteúdos de aprendizagem, já que em nenhum momento são levadas em conta como objetos de ensino, mas como meios para a memorização e, portanto, não se ensinam nem se avaliam diretamente. As atitudes que se desenvolvem nesta unidade não vão além das necessidades para a manutenção da ordem e do respeito dos professores. Com tudo isto podemos concluir que os conteúdos que se trabalham são conceituais e que o objetivo fundamental dos professores consiste em que os alunos "saibam" determinados conhecimentos.

• Os conteúdos da unidade 2 são fundamentalmente procedimentais no que se refere ao uso do algoritmo e conceituais quanto à compreensão dos conceitos associados, neste caso os de fração, sintagma nominal ou velocidade. Os conteúdos atitudinais mais claros só aparecem na fase de diálogo entre alunos e professor ou professora, enquanto que nas outras fases são apenas o resultado do papel exigido. 

• Na unidade 3 se pretende que os alunos cheguem a conhecer determinados conteúdos de caráter conceituai. Para sua compreensão se utiliza uma série de técnicas e procedimentos - diálogo e debate, fundamentalmente mas como na primeira unidade analisada, estes conteúdos têm uma função de uso, já que certamente não serão levados em conta ao se avaliar. Os conteúdos atitudinais que aparecem - interesse em fazer propostas, participação nos diálogos e debates, respeito pela vez de falar e pela opinião dos demais - tampouco serão considerados conteúdos avaliáveis. Vemos, pois, que nesta unidade aparecem atividades que, apesar de se centrarem na aprendizagem de conteúdos conceituais, utilizam conteúdos de caráter procedimental e atitudinal, e que aparentemente não são objeto de estudo porque não há uma intenção explicitamente educativa, uma vez que tampouco são objeto da avaliação. Se isto é assim, e estes conteúdos procedimentais não são avaliados no desenvolvimento da unidade nem ao final dela, podemos concluir que a-única coisa que se pretende é a aprendizagem de conteúdo os conceituais, que "saiba m " sobre temas históricos, sociais, literários, artísticos ou científicos. Pelo contrário, se os conteúdos de caráter procedimental ê atitudinal que se trabalham são avaliados posteriormente e, portanto, se tem consciência de que também são conteúdos que devem se "ensinar" enquanto são utilizados, poderemos dizer que se pretende que os meninos e meninas "saibam" os temas, "saibam fazer" diálogos e debates e "sejam" participativos e respeitosos.

Na unidade 4- vemos que em praticamente todas as atividades que formam a sequência aparecem conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais. Neste caso, os alunos controlam o ritmo da sequência; atuando constantemente e utilizando uma série de técnicas e habilidades: diálogo, debate, trabalho em pequenos grupos, pesquisa bibliográfica, trabalho de campo, elaboração de questionários, entrevista, etc. Ao mesmo tempo, encontram-se diante de uma série de conflitos pessoais e grupais de sociabilidade que é preciso resolver, o que implica que devam ir aprendendo a "ser" de uma determinada maneira: tolerantes, cooperativos, respeitosos, rigorosos, etc. Nesta sequência vemos que, como nas outras, aparecem conteúdos das três categorias. Mas neste caso existe um trabalho muito explícito no campo dos conteúdos procedimentais e atitudinais. Do mesmo modo que na unidade anterior, o fato de que apareçam estes conteúdos não quer dizer que exista uma consciência educativa. Enquanto isto não se traduza na maneira de trabalhar estes conteúdos por parte dos professores e não sejam objeto de avaliação, não poderemos considerá-los conteúdos explícitos de aprendizagem. No entanto, se nos detemos na fase de avaliação, pode se ver que não se faz apenas uma avaliação da prova realizada, mas que a classificação é o resultado das observações feitas durante toda a unidade. Neste caso, pode se afirmar que se pretende que os alunos "saibam" os termos tratados, "saibam fazer" questionários, investigações, entrevistas, etc., e que cada vez "sejam" mais tolerantes, cooperativos, organizados, etc.

Uma primeira avaliação feita segundo a tipologia de conteúdos, como reflexo da função que se atribui ao ensino, permite nos darmos conta de que nos três primeiros casos encontramos diferentes formas de ensinar que não deixam de estar situadas num modelo de formação centrado nos conteúdos convencionais ligados ao "saber" e ao "saber fazer" mais ou menos acadêmicos, com uma função basicamente propedêutica. No caso da unidade 4, se não fosse a aparência de que a avaliação observa os diferentes tipos de conteúdo, poderíamos dizer que se trata de uma forma de ensinar que também se limita aos conteúdos convencionais do "saber", e também poderíamos pensar que os procedimentos, os valores e as atitudes que se desenvolvem são simplesmente' uma estratégia para fazer com que a aprendizagem seja mais interessante ou mais profunda. Por outro lado, dado que a avaliação também contempla os procedimentos e atitudes como conteúdos de aprendizagem, podemos considerar que o objetivo do ensino, para este professor ou professora, atende a uma formação mais integral.

A avaliação que podemos fazer destes casos até agora está relacionada à ideia que temos sobre o que deve ser o ensino e, portanto, na maior ou menor coincidência com os objetivos implícitos de cada uma das unidades. Numa primeira aproximação, e se partíssemos do pressuposto de que estes professores sempre utilizam a mesma forma de ensinar, poderíamos estar mais ou menos de acordo com cada um deles, segundo o sentido e o papel que nós atribuímos ao ensino. Agora, se nossa concepção perseguisse a formação integral do aluno, só poderíamos nos inclinar para a unidade 4, já que é o único caso em que se trabalham explicitamente as diferentes capacidades da pessoa. Mas, inclusive neste caso, seria necessário comprovar posteriormente se existe uma coincidência com o tipo de cidadão e cidadã que se promove. No entanto, em nenhum caso podemos pensar que estas são as únicas formas de trabalhar e, portanto, podemos pensar que o próprio professor combina estes quatro tipos de unidades, além de outras. Assim, supondo que em cada caso estes sejam os conteúdos que se querem trabalhar, nos interessa descobrir se a sequência didática proposta serve para alcançar os objetivos previstos, quer dizer, se promove a aprendizagem. É neste momento que temos que nos perguntar se todas as sequências são úteis para chegar àquilo que pretendemos. Então, é o momento de utilizar o outro referencial de análise: a atenção à diversidade e a concepção construtivista.

A CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA E A ATENÇÃO À DIVERSIDADE

Podemos extrair do conhecimento da forma de produção das aprendizagens duas perguntas: a primeira, relacionada com a potencialidade das sequências para favorecer o maior grau de significância das aprendizagens, e a segunda, sua capacidade para favorecer que os professores restem atenção à diversidade.

Expressada de forma muito sintética, e como vimos, a aprendizagem é uma construção pessoal que cada menino e cada menina realizam graças à ajuda que recebem de outras pessoas. Esta construção, através da qual podem atribuir significado a um determinado objeto de ensino, implica a contribuição por parte da pessoa que aprende, de seu interesse e disponibilidade, de seus conhecimentos prévios e de sua experiência. Em tudo isto desempenha um papel essencial a pessoa especializada, que ajuda a detectar um conflito inicial entre o que já se conhece e o que se deve-saber, que contribui para que o aluno se sinta capaz e com vontade pelo, que propõe o novo conteúdo como um desafio interessante, cuja resolução terá alguma utilidade, que intervém de forma adequada nos progressos e nas dificuldades que o aluno manifesta, apoiando-o e prevendo, ao mesmo tempo, a atuação autônoma do aluno. É um processo que não só contribui para que o aluno aprenda certos conteúdos, mas também faz com que aprenda a aprender e que aprenda que pode aprender. Sua repercussão não se limita ao que o aluno sabe, igualmente influi no que sabe fazer e na imagem que tem de si mesmo.

Este conhecimento nos permite estabelecer uma série de perguntas ou questões variadas, diferentes sequências didáticas com o objetivo de = reconhecer sua validade, mas, sobretudo, de nos facilitar pistas para reforçar algumas atividades ou acrescentar outras novas. As perguntas podem ser feitas da seguinte forma: Na sequência didática existem atividades:

a)     que nos permitam determinar os conhecimentos prévios que cada aluno tem em relação aos novos conteúdos de aprendizagem?

b)     cujos conteúdos são propostos de forma que sejam significativos e funcionais para os meninos e as meninas?

c) que possamos inferir que são adequadas ao nível de desenvolvimento de cada aluno?

d)   que representem um desafio alcançável para o aluno, quer dizer, que levam em conta suas competências atuais e as façam avançar com a ajuda necessária; portanto, que permitam criar zonas de desenvolvimento proximal e intervir?

e) que provoquem um conflito cognitivo e promovam a atividade mental do aluno, necessária para que estabeleça relações entre os novos conteúdos e os conhecimentos prévios?

f) que promovam uma atitude favorável, quer dizer, que sejam motivadoras em relação à aprendizagem dos novos conteúdos?

g) que estimulem a autoestima e o autoconceito em relação às aprendizagens que se propõem, quer dizer, que o aluno possa sentir que em certo grau aprendeu, que seu esforço valeu a pena?

h) que ajudem o aluno a adquirir habilidades relacionadas com o aprender a aprender, que lhe permitam ser cada vez mais autônomo em suas aprendizagens?

Se utilizamos estas perguntas nas quatro unidades que apresentamos como exemplo, poderemos estabelecer as considerações que se expõem a seguir.

1. Comunicação da lição

2. Estudo individual sobre o livro-texto

3. Repetição do conteúdo aprendido

4. Prova ou exame

5. Avaliação

Unidade 1

a) Conhecimentos prévios

Nesta unidade podemos observar que o professor ou a professora pouco controla o processo de aprendizagem dos alunos, as atividades propostas não lhes permitem saber de que conhecimentos prévios dispõem. O professor supõe que todos os meninos e meninas sabem do que necessitam para esta unidade, ou prescinde deste conhecimento. Em todo caso, podemos supor que parte do resultado da última avaliação. Se esta informação é insuficiente, certamente bastaria introduzir urna atividade inicial, por exemplo, um diálogo ou debate sobre o tema, que facilitasse informar-se sobre os conhecimentos dos alunos para que servisse corno ponto de partida da exposição.

b) Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Pela descrição da sequência não podemos saber se os conteúdos tratados são suficientemente significativos ou funcionais. Que o sejam ou não depende de como se tenha iniciado a intervenção. Se a exposição é uma simples transmissão dos conteúdos que não guarda nenhuma relação com algum fato próximo à realidade experiencial ou afetiva do aluno - como partir de alguma situação conflitante ou problemática -, os conteúdos do tema serão considerados somente como uma lição que é preciso conhecer para desempenhar-se com êxito na prova e não tanto como um conhecimento que é interessante possuir.

c) Nível de desenvolvimento

O grau de complexidade da exposição e o número de variáveis inter-relacionadas que se utilizem determinarão a dificuldade da compreensão. Se à exposição não se acrescentam atividades de diálogo com os alunos ou entre eles, que permitam nos darmos conta da conveniência dos novos conteúdos, tanto em relação às dificuldades de compreensão como a sua capacidade, será um processo sem controle, no qual a aprendizagem dependerá apenas da capacidade pessoal de cada um dos meninos e meninas.

d) Zona de desenvolvimento proximal

Se, quando se estabeleceram formas de comunicação individualizadas, já é bastante difícil determinar se os desafios que se propõem aos alunos e o tipo de ajuda são apropriados para cada um deles, poder controlar esta condição é praticamente impossível numa sequência como esta. Será necessário introduzir atividades que estimulem os alunos a expressar o que pensam sobre o tema tratado, de forma que nos deem pistas acerca dos diferentes níveis de complexidade que deve ter a exposição.

c) Conflito cognitivo e atividade mental

Numa sequência deste tipo, o professor nunca controla a atividade mental do aluno. Se a exposição introduz as possíveis questões, paradoxos ou contradições, sem dúvida favorecerá os conflitos cognitivos de alguns alunos, mas não os de todos, nem com a profundidade suficiente para garantir que cada um deles realize o processo construtivo que a aprendizagem exige. Para poder influir no processo de elaboração individual, na atividade mental de cada menino e menina, terá que introduzir atividades que obriguem os alunos a questionar seus conhecimentos e a reconsiderar as interpretações que fizeram deles.

f) Atitude favorável

A motivação para a aprendizagem não decorre da sequência em si mesma, ao menos neste caso, já que tal como está descrita não conta com nenhuma atividade prévia à exposição para despertar o interesse dos alunos. O fato de que seja mais ou menos interessante dependerá da forma e das características da exposição. A maneira de fazê-la, o tipo de relações e cumplicidades que se estabelecem entre professor e aluno, os exemplos, a empatia e o grau de comunicação são as cartas de que o professor pode dispor, numa sequência deste tipo, para fomentar o interesse pela aprendizagem. Se efetuamos uma leitura tópica desta sequência, tal como a descreve Bini, certamente poderemos dizer que as razões que justificam a motivação dos alunos estão fora do conteúdo de aprendizagem e se centram em alcançar alguns bons resultados. O que mais importa não é saber, mas superar as provas da avaliação, de maneira que as estratégias de aprendizagem que se mobilizam são aquelas que garantem o êxito na prova e não no conhecimento. Para poder incidir nesta variável é necessário pôr em jogo diferentes recursos que não podem se concretizar somente numa atividade mais ou menos satisfatória no começo da unidade, mas terá que complementá-la com uma série de medidas estreitamente relacionadas com a necessidade de promover a autoestima e o autoconceito de cada menino e menina.

g)     Autoestima e autoconceito

Este tipo de sequência dispõe poucos meios para o professor se relacionar afetivamente com os alunos, daí que é muito difícil que os aspectos associados aos sentimentos, às avaliações próprias e dos outros, às expectativas, etc. se traduzam em ações dos professores que possam incidir favoravelmente. Devemos ter presente que, usando exclusivamente uma sequência deste tipo, os momentos de relação pessoal se limitam a alguns contatos esporádicos, muitas vezes fora da aula, ou à informação, geralmente por escrito e muito concisa, que se dá nas avaliações. Se levamos em conta que o fomento da autoestima e do autoconceito é fundamental para favorecer a aprendizagem, teremos que introduzir atividades que permitam intercâmbios frequentes professor/ aluno. Teremos que reconsiderar, também, que sentido deve ter a avaliação, para que se centre não tanto no que lhes falta aprender como no progresso que estão experimentando.

h)     Aprender a aprender

Neste modelo, as atividades que o aluno realiza de forma independente são básicas. A partir da exposição do professor ou da professora, o aluno fica com o papel principal - será ele que fará o estudo, as atividades de memorização e a prova, de maneira que terá que se virar naquelas atividades que lhe permitam superar as provas ou exames. Tanto é assim que estas últimas certamente serão as habilidades em que conseguirá ser mais competente. Mas não devemos esquecer que não são habilidades exclusivas, nem certamente as mais importantes, para posteriormente realizar aprendizagens de maneira autônoma - sempre que entendamos que estas aprendizagens não são unicamente as relacionadas com a superação de provas mais ou menos escolares.

Conclusões

Podemos deduzir, desta análise, que dificilmente se pode atender aos princípios de uma aprendizagem significativa e que leve em conta a diversidade se não se incluem muitas outras atividades que ofereçam mais informação acerca dos processos que os alunos seguem, que permitam adequar a intervenção a estes acontecimentos. Mas como veremos quando tratarmos, neste mesmo capítulo, do ensino dos conteúdos factuais e conceituais, esta sequência é, com algumas mudanças, muito benéfica. Principalmente quando os conteúdos são factuais (nomes, obras, datas, aconteci mentos, dados, descrições, etc.) ou quando os conceitos são suficientemente simples para a idade dos alunos. Neste caso, somente se atendidas as condições que promovem a motivação, dado que há poucas dificuldades de compreensão e que muitas vezes a simples exposição e memorização posterior é suficiente para que a aprendizagem seja significativa. Por outro lado, quando os conteúdos são mais complexos, esta sequência é muito simples para poder satisfazer todas as condições de que os professores necessitam para controlar os processos de ensino que garantam uma aprendizagem verdadeiramente compreensiva.

O desprestígio de que goza esta sequência, nas posições progressistas, se deve ao uso único e excludente que se faz dela e ao fato de ser utilizada normalmente pelas propostas que consideram que uma das SB funções primordiais do ensino é a seletiva, transformando assim o modelo de intervenção num instrumento seletivo essencial. De certo modo se diz: não apenas não serve quem não sabe, como tampouco serve quem não é capaz de aprender um sistema de exposição simples. Quem não aprende desta maneira não está preparado ou não está em condições de seguir os estudos. O êxito, ou a sobrevivência no modelo, é o que o legitima, ao mesmo tempo, como meio e como fim em si mesmo. Mas este uso perverso do modelo de sequência não deve nos fazer perder de vista sua potencialidade para determinados conteúdos.

Unidade 2

1 Apresentação, por parte do professor ou da professora, de uma situação problemática 2. Busca de soluções 3. Exposição do conceito e algoritmo 4. Generalização. 5. Aplicação 6. Exercitação 7. Prova ou exame 8. Avaliação

a)     Conhecimentos prévios

A segunda atividade desta sequência, quando o professor pede aos alunos diferentes formas de resolver o problema ou conflito, é a que pode permitir saber que conhecimentos têm acerca do tema em questão. Mas para que isto seja assim, será necessário que estas perguntas, e principalmente as respostas, tenham sido feitas pelos alunos que se encontram numa situação mais desfavorável e não apenas por uns poucos alunos, nem por aqueles que geralmente dispõem de mais informação. Caso contrário, é fácil cair na ilusão de acreditar que as respostas dadas espontaneamente por parte dos alunos correspondem ao conhecimento de todos e de cada um dos meninos e meninas.

b)     Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Esta sequência resolve com clareza esta condição, já que o conceito não aparece antes de que tenha se apresentado sua necessidade. Em primeiro lugar, foi preciso elaborar o conceito para poder resolver o problema, de maneira que o termo aparece quando já se construiu o significado. A generalização necessária de todo conceito se produz quando já se comprovou seu valor num caso concreto e não antes. Nas atividades posteriores de aplicação, irá se aprofundar na significância e na funcionalidade dos conceitos. No entanto, a ressalva que podemos fazer está relacionada com o grau de participação na elaboração do conceito, de maneira que se não existe um diálogo constante entre professor e alunos, especialmente com os que apresentam mais dificuldades, pode se produzir o paradoxo de que a única pessoa que realmente construiu o significado do novo conteúdo seja o próprio professor.

c)     Nível de desenvolvimento

Como acontece com os conhecimentos prévios, o momento fundamental para determinar a capacidade dos alunos para compreender os novos conteúdos é a atividade em que eles mesmos propõem soluções ao problema colocado pelo professor ou professora. Sempre que estas propostas não sejam de uns poucos alunos nem as dos menos representativos. Nas atividades posteriores de exercitação e sobretudo nas de aplicação, também poderemos comprovar o grau de compreensão e as dificuldades de cada aluno.

d)     Zona de desenvolvimento proximal

A informação que pode se tirar da segunda atividade pode indicar onde se deve situar os desafios na exposição que dará lugar à conceitualização. Mas isto não bastará se na exposição não se introduz um diálogo com todos os alunos, que permita reconduzir o discurso segundo as interpretações que façam. Os dados que tenhamos sobre o que sabem e podem saber ou fazer serão cruciais no planejamento dos exercícios. Esta informação deve nos permitir estabelecer uma ordenação progressiva das atividades, a fim de que cada aluno avance segundo seu ritmo e suas possibilidades reais.

e)     Conflito cognitivo e atividade mental

A primeira atividade proposta, em que o professor propõe uma situação problemática, e a segunda, em que os alunos tentam dar uma resposta, são as que permitem satisfazer esta condição. Estes problemas, caso se consiga que os alunos se apropriem deles, são os que devem promover a atividade mental necessária para a construção do conceito. Mas toda a sequência está sujeita a esta condição, de maneira que o processo de generalização e a aplicação descontextualizadora posterior efetivam esta fruição de incentivo à construção de significado. Será preciso ver o grau de envolvimento dos alunos neste processo, a fim de que não se limite a um acompanhamento mecânico de alguns passos supostamente construtivos.

f)      Atitude favorável

A primeira atividade pode cumprir uma função motivadora sempre que os problemas propostos tenham sua origem em situações próximas dos interesses dos alunos. Portanto, dependerá do tipo de problemas e das situações propostas que os alunos estejam dispostos a aprender. O grau de envolvimento dos alunos em todo o processo também será o que nos informa sobre sua atitude. Devemos levar em conta que, com exceção das duas primeiras atividades e as posteriores, de aplicação e exercitação, os intercâmbios possíveis com os alunos podem ser insuficientes para mantê-los interessados. Também dependerá do papel da avaliação e do tipo de provas que se realizem, já que o interesse pelo saber pode se deslocar facilmente para o interesse pela nota ou conceito.

g)     Autoestima e autoconceito

O fato de partir das opiniões dos alunos e de suas contribuições para resolver os problemas é uma forma de avaliá-los. Nesta sequência, apesar de se dar muita importância aos conhecimentos e às ideias dos alunos, a potencialização ou a não-potencialização da imagem pessoal dependerá do tipo de comentários efetuados e do tipo de avaliações realizado ao longo da unidade. Será também o tipo de avaliação, mas sobretudo a avaliação que se faça tanto dos resultados obtidos como dos processos seguidos, o que determinará que a autoestima ou o autoconceito sejam mais ou menos positivos.

h)     Aprender a aprender

A contribuição essencial desta sequência é que segue fases fundamentalmente indutivas, nas quais o aluno elabora certos conceitos e faz a descontextualização necessária de toda generalização, aplicando o conceito em outras situações. Esta forma de pensar lhe oferece estratégias cognitivas extremamente valiosas em qualquer situação de aprendizagem. Mas, apesar disso, o grau de autonomia do aluno é limitado e as habilidades aprendidas se concretizam mais no contexto escolar: estudo compreensivo, memorização e exercitação.

Conclusões

Como pudemos ver, esta sequência satisfaz de maneira adequada muitas das condições que fazem com que a aprendizagem possa ser o mais significativa possível. Permite prestar uma atenção notável às características diferenciais dos alunos, sempre que se introduza um maior número de intercâmbios que favoreça o deslocamento do Protagonismo para os alunos. E é aqui que se encontra a grande debilidade desta sequência, já que facilmente se corre o risco de dar por bom o discurso do professor e as respostas de alguns alunos como supostos representantes do pensamento da maioria. Ao mesmo tempo, a motivação inicial pode perder força se não se introduzem atividades que dêem sentido à tarefa de aprendizagem, principalmente nas atividades mais pesadas de exercitação. E, finalmente, é crucial o papel que se atribui à avaliação, já que pode modificar por completo a valoração da sequência segundo a função que este elemento tenha na unidade.

d) Zona de desenvolvimento proximal

A segunda e terceira atividades são cruciais para examinar o que pensam os alunos, que dúvidas têm e que interpretações fazem. Esta série de informações pode ser suficiente para orientar o tipo de exemplos que é preciso dar, ou argumentos que é preciso colocar para que a construção do conhecimento seja realizada por todos os meninos e meninas.

 Unidade 3

1. Apresentação por parte do professor ou da professora de uma situação problemática em relação a um tema 2. Diálogo entre professor ou professora e alunos 3. Comparação entre diferentes pontos de vista 4. Conclusões 5. Generalização 6. Exercícios de memorização 7. Prova ou exame 8. Avaliação.

a)     Conhecimentos prévios

Como se pode ver, esta sequência apresenta uma diferença fundamental em relação às anteriores no que se refere ao grau de participação dos alunos. As duas primeiras atividades são como as da unidade 2. Portanto, como naquele caso, a segunda permite examinar com bastante fidelidade que conhecimentos têm os meninos e meninas, sempre que todos participem do diálogo. Neste caso, devemos acrescentar que os alunos participam na maioria das atividades que compõem a unidade,  fato que permite que o conhecimento sobre o estado de elaboração e o que sabem apareça frequentemente e que possibilita, ao mesmo tempo, a adequação das intervenções do professor às necessidades que se apresentam.

b)     Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

O esquema da sequência é muito similar ao anterior, mas além das mudanças determinadas pelo grau de participação dos alunos, cabe acrescentar que neste caso só se tratam de maneira manifesta conteúdos de caráter conceituai, enquanto que no anterior os procedimentais eram básicos. Como no modelo anterior, isto faz com que o sentido das aprendizagens esteja claramente determinado desde o começo. Os novos conteúdos de aprendizagem aparecem, no princípio, como meios para resolver os conflitos que o professor propôs e não como um conhecimento fora de um contexto mais ou menos próximo do aluno.

c)     Nível de desenvolvimento

A participação dos alunos durante a sequência permite, desde que o professor esteja alerta, reconhecer as dificuldades de compreensão que se apresentam. Portanto, é possível adequar as explicações aos diferentes graus de assimilação.

e) Conflito cognitivo c atividade mental

O ponto de partida desta sequência é a criação do conflito cognitivo e a ativação do pensamento, de maneira que esta é uma das funções da primeira atividade. Mas este argumento não se limita a esta atividade, senão que nas seguintes se busca que os alunos manifestem suas opiniões, a fim de que lhes seja mais fácil entender as conclusões e o processo de generalização. No entanto, dado o protagonismo que o professor tem ao tirar conclusões, e no momento da generalização, é bem possível que este processo construtivo só seja realizado por aqueles capazes de participar ativamente. Certamente será necessário introduzir alguma atividade que promova um maior grau de participação dos alunos no processo de generalização e, portanto, um maior controle do professor sobre o processo de aprendizagem.

f)      Atitude favorável

Esta é a outra função que a primeira atividade deveria cumprir. O fato de que se parta de uma situação conflitante pode facilitar que os alunos se engajem, mas, logicamente, para que este interesse não se manifeste apenas nos mais estimulados intelectualmente, será necessário entreter os alunos para permitir a participação de todos. A vantagem desta unidade é que oferece a possibilidade de potencializar nas atividades seguintes, o interesse inicial ou favorecer outros momentos para provocá-lo novamente. Como sempre, o papel que desempenhe a avaliação será crucial como meio para promover interesse pelo conteúdo de aprendizagem ou simplesmente pela nota final.

g)     Autoestima e autoconceito

As opiniões dos alunos são a-matéria-prima para a construção do discurso do professor e para gerar as conclusões. É lógico que se os diferentes momentos de diálogo são utilizados para promover a avaliação pessoal, estes ajudarão na formação de imagens positivas. Mas o simples fato de que haja um maior número de relações interpessoais não quer dizer que ajudem na melhora do autoconceito. O tipo pie intercâmbios, as avaliações que se fazem das opiniões e, principalmente, o tipo de valoração final das aprendizagens alcançadas e sua publicidade serão peças cruciais na construção positiva da autoestima.

O que comentamos na unidade 2 em relação a este fator também pode se aplicar a esta unidade. Esta sequência ajuda a promover certas habilidades de construção pessoal de conceitos, às quais é preciso acrescentar as técnicas de estudo e de memorização. Todas elas são estratégias cruciais para possibilitar novas aprendizagens, mas têm. o defeito de se limitar a um determinado tipo de habilidades, embora sejam, sem dúvida, as mais habituais no contexto escolar.

Conclusões

Esta sequência, pelo fato de seguir um esquema centrado na construção sistemática dos conceitos^ e oferecer um grau notável de participação dos alunos, especialmente nos processos iniciais, satisfaz em grande parte, as condições que possibilitam que as aprendizagens sejam o mais significativas possível. As carências são consequência da dificuldade para manter o controle do processo individual de cada aluno. É fácil cair na tentação de acreditar que todos e cada um dos meninos e meninas participam numa autentica construção pessoal de significados. Dado que o ritmo da classe, e sobretudo a obtenção de conclusões, tem como protagonista o professor ou a professora, pode se cair facilmente numa situação em que os alunos se limitam apenas a reproduzir as explicações finais - objeto de avaliação - e considerem as atividades prévias como uma simples liturgia necessária para dar um tom atual à intervenção educativa. Neste caso, será responsabilidade do tipo de provas de avaliação conseguir que a aprendizagem seja mais ou menos profunda, que se reduza à simples exposição das conclusões e generalizações, ou que se converta num instrumento da revisão que o aluno faz — do processo que seguiu, desde as perguntas iniciais até a elaboração de suas próprias "descobertas".

Unidade 4

1. Apresentação por parle do professor ou da professora de uma situação problemática em relação a um tema

2. Proposição de problemas ou questões

3. Explicitação de respostas intuitivas ou suposições

4. Proposta das fontes de informação

5. Busca da informação

6. Elaboração de conclusões

7. Generalização das conclusões e síntese.

8. Exercícios de memorização

9. Prova ou exame

10. Avaliação

a) Conhecimentos prévios

Como nas duas unidades anteriores, as atividades iniciais têm como uma das funções prioritárias evidenciar os conhecimentos prévios.

No entanto, neste caso a estrutura da sequência se organiza em torno das contribuições que os alunos fazem em cada momento. São eles que manifestam seus problemas ou perguntas, que serão os que deverão articular toda a intervenção. O objetivo da unidade não consiste em conhecer um tema, mas em dar resposta a determinadas perguntas que os alunos se fazem e que consideram que é interessante resolver. Também se parte dos princípios de que os alunos possuem um conhecimento. Portanto, antes de iniciar a investigação, busca-se que este conhecimento aflore ou que os alunos se inclinem por possíveis soluções, quer dizer, que elaborem suas hipóteses ou suposições. Estes dados serão cruciais para saber que conhecimentos têm os alunos sobre o tema tratado. O problema surge quando nos perguntamos qual é o grau de envolvimento dos alunos nas perguntas e hipóteses que fazem. Neste ponto é necessário empreender um trabalho em pequenos grupos ou individualmente, que ajude todos- os meninos e meninas a participarem em sua elaboração. Nesta sequência, o papel fundamentai do professor consiste em incentivar a participação. Se não há participação, o processo só será seguido por uns poucos, embora se tenha a falsa impressão de se tratar de um processo coletivo.

b) Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Neste caso, o que se" aprende sempre é o resultado da resposta às perguntas que se fazem. Portanto, todos os conteúdos que se referem ao tema têm sentido como meios para ampliar o conhecimento ou resolver situações que os alunos considerem interessantes, já que se não fosse assim não teriam feito a pergunta. Assim, quanto aos conteúdos conceituais, a significância e a funcionalidade estão garantidas. Por outro lado, se nos detemos nos conteúdos procedimentais, nos damos conta de que nunca aparecem como uma necessidade da aprendizagem escolar, mas como um meio imprescindível para resolver os problemas ou questões colocados. A realização de uma pesquisa bibliográfica ou a utilização da medida, da enquete, da observação direta, da experimentação, etc., para não mencionar todas as habilidades, técnicas e estratégias ligadas às funções da língua - ler, escrever, escutar, falar têm lugar de forma natural em função de uma necessidade de uso, o que implica a evidente significância destas aprendizagens.

c) Nível de desenvolvimento

As perguntas feitas, as suposições propostas, o diálogo que se estabelece em pequenos grupos ou coletivamente, o tipo de técnicas de informação utilizadas, os dados selecionados, etc., podem proporcionar informação suficiente para determinar qual o grau de dificuldade de aprendizagem que apresenta o tema. No entanto, será necessário que o professor ou a professora não deixe nas mãos de uns poucos alunos a dinâmica do processo e que intervenha para promover a participação e a explicitação do pensamento de todos os meninos e meninas.

d) Zona de desenvolvimento proximal

A segunda e a terceira atividades são cruciais para examinar o que pensam os alunos, que dúvidas têm e que interpretações fazem. Esta série de informações pode ser suficiente par orientar o tipo de exemplos ou argumentos que é necessário oferecer a fim de que a construção do conhecimento seja realizada por todos e cada um dos meninos e meninas.

e)     Conflito cognitivo e atividade mental

Apesar do fato de que a sequência se articula segundo o esquema da pesquisa, o que quer dizer que seu desenvolvimento implica um profundo processo intelectual, seguidamente os aspectos que chamam mais a atenção das fases de investigação - por exemplo, visitas, observações, ensaios de laboratório, entrevistas, elaboração de simulações ou produtos podem fazer com que o aluno demonstre muita atividade sem que estas ações cheguem a se transformar no meio intencional para favorecer a realização do processo mental exigido pela aprendizagem. Tanto é assim que, com a passagem do tempo, muitas vezes os alunos se limitam a recordar os aspectos mais episódicos do trabalho realizado. Agora, esta consideração não tem cabimento nesta unidade, já que houve um verdadeiro trabalho nas fases 1, 2, 3 e 4. No entanto, seria um comentário acertado naquelas unidades cujas atividades de pesquisa são feitas sem que o aluno participe da definição de razões que justificam a saída, a experimentação ou a observação, de forma que se convertem em atividades sem nenhum outro sentido além da decisão mais ou menos arbitrária do professor. Fazem-se coisas bastante interessantes, mas não se sabe- o porquê. O que deveria ser um meio para promover a atividade mental, dado que para favorecê-la é preciso contribuir com manipulações - sobretudo em determinadas idades -, se converte numa finalidade em si mesma.

f)      Atitude favorável

A motivação é-a alma da sequência. Ou os alunos estão interessados ou a sequência se interrompe em alguma das fases. A atividade inicial pretende criar os primeiros interesses e deve ser a que provoca as perguntas. E, pois, a peça-chave da unidade. Ou se criam as condições para que os meninos e meninas formulem as questões que querem resolver ou dificilmente se pode seguir adiante. Mais, todas as fases posteriores giram em torno do protagonismo dos alunos, de tal forma que além de ser um fator motivador em si mesmas, a tensão necessária para desenvolver a unidade passa pela manutenção constante do interesse. E aqui é onde o papel do professor adquire todo seu sentido, como favorecedor e dinamizador de todo o processo, estabelecendo os desafios individuais e coletivos e oferecendo meios que mantenham a atenção dos alunos.

g)     Autoestima e autoconceito

Nesta unidade, todo o peso do trabalho repousa na dinâmica do grupo. Suas contribuições são as que configuram as diferentes fases da sequência e a maioria dos conteúdos. Portanto, há uma valoração das contribuições e dos conhecimentos dos alunos e certas expectativas em relação às suas capacidades, tanto para solucionar os problemas que lhes suscitam os temas tratados, como para resolver os conflitos de todo tipo e surgirão numa sequência pouco determinada. Ao mesmo tempo, levando em conta a quantidade de relações que se estabelecem, as possibilidades de intervir durante o processo permitem fazer avaliações que ajudem ou não a criar sensações positivas de autoestima e auto conceito. Logicamente, será a consciência dos professores diante destas necessidades que influirá nas idéias dos alunos, já que, evidentemente, a umidade não o garante por si mesma. Por último, temos que examinar novamente o papel decisivo da avaliação. Neste caso, o único traço diferencial que encontramos é o fato de que a avaliação não apenas é o resultado da prova, como também do trabalho realizado ao longo da unidade. Agora, em nenhum caso podemos saber que tipo de avaliação se faz, o que nos permite tirar conclusões sobre se promove ou não as avaliações pessoais que melhoram a autoestima e o autoconceito.

h)     Aprender a aprender

Este é um dos fatores mais claros nesta unidade, no mínimo pelo fato de incluir, além das habilidades escolares de estudo individual, muitas outras de variedade e características suficientemente diferenciadas. Dependendo dos diferentes tipos de instrumentos ou fontes de informação, sejam diretos ou indiretos, o número de técnicas e habilidades para favorecer que aprendam a aprender será notável, mas será necessário que haja um verdadeiro trabalho de ensino destas estratégias de aprendizagem, um trabalho que não se reduza a um uso mais ou -menos episódico.

Conclusões

Esta sequência, comparada com os demais, é-a que apresenta uma maior variedade de atividades, o que logicamente lhe permite satisfazer a totalidade dos condicionantes, a fim de que as aprendizagens sejam o mais significativas possível. Para que estas razões sejam acertadas, os professores deverão ter uma consciência clara a respeito do sentido de cada fase. Numa unidade deste tipo é fácil se deixar levar pela dinâmica do grupo e perder de vista os objetivos que se perseguem. Os problemas e a complexidade da organização do grupo fazem com que esta tarefa ocupe um espaço de tempo notável, somado à necessidade de reconduzir os interesses naturais dos alunos para os objetivos previstos. Apesar de tudo, o maior risco está na possibilidade de cair no denominado falso ativismo, quer dizer, que a atenção do educador se centre nas atividades de pesquisa: observações diretas, visitas, excursões, elaborações, etc., abandonando as atividades prévias e posteriores que são básicas para alcançar a compreensão dos conhecimentos propostos. Embora este não seja o caso, também é possível que não realize um trabalho sério de estudo, posterior às atividades de compreensão, de forma que não haja oportunidade para se fazer os exercícios de memorização imprescindíveis para possibilitar sua lembrança posterior.

AS SEQÜÊNCIAS DE CONTEÚDO, OUTRA UNIDADE DE ANÁLISE

A confluência do referencial construtivista com a explicitação dos conteúdos segundo sua tipologia nos permitiu analisar algumas sequências didáticas, isto tornou possível que examinássemos os diferentes conteúdos e chegássemos a algumas conclusões sobre a necessidade de insistir, modificar ou ampliar estas sequências com outras atividades. No entanto, vocês devem ter se dado conta de que a análise focalizou os conteúdos conceituais, deixando de lado os outros, de tal forma que a maioria das considerações foi feita em relação a estes conteúdos. Portanto, as atividades propostas têm por objetivo a melhora da significância na aprendizagem dos conteúdos conceituais. Esta inclinação é determinada pelas próprias características das sequências. Como pudemos ver, todas elas trabalham conteúdos conceituais, mas só a segunda introduz determinados conteúdos procedimentais, enquanto que a quarta os amplia com outros de tipo procedimental e atitudinal. Assim, pois, o estudo esteve condicionado pelas características das sequências. Se, em vez de nos centrarmos preferencialmente nos conteúdos conceituais, tivéssemos prestado atenção aos procedimentais e atitudinais, poderíamos considerar que a análise está completa?

Em primeiro lugar, vamos nos deter na segunda sequência que, além dos conceitos, considera como conteúdos de aprendizagem os algoritmos, a análise sintática ou a aplicação da fórmula da velocidade, segundo os exemplos de uma ou outra área. Agora, a pergunta que nos colocamos é a seguinte: com a sequência descrita e o conhecimento que temos sobre a aprendizagem destes conteúdos de caráter procedimental, podemos deduzir que as atividades propostas são apropriadas? Nesta unidade pudemos comprovar que algumas atividades tomaram possível a compreensão dos conceitos associados aos procedimentos, de maneira que os meninos e meninas podem entender que função têm e como são utilizados, ao mesmo tempo que fizeram toda uma série de exercícios para se iniciar em seu domínio. Se agora examinamos os conteúdos procedimentais da unidade 4, veremos que se utilizam alguns como o trabalho em equipe, a pesquisa, a entrevista, etc. Mas com o trabalho realizado nestas duas unidades não podemos assegurar que os alunos cheguem a dominar estes diferentes procedimentos e técnicas. Sabemos que os trabalham, mas isto não basta. Para que realmente cheguem a dominá-los, será necessário, em primeiro lugar verificar se nas outras unidades, anteriores e posteriores, há momentos em que estes conteúdos voltam a aparecer.

Ampliemos agora nosso objeto de análise aos conteúdos atitudinais que podem ser trabalhados na unidade 4 e nos perguntemos: nesta unidade, se aprendeu a ser mais tolerante, respeitoso e cooperador? Nossa resposta nos fará ver ainda mais a necessidade de revisar não apenas as unidades anteriores e posteriores da própria área ou disciplina, como todas as unidades de todas as áreas que incidem nos alunos. Assim, pois, vemos que nos falta uma nova unidade de análise que se centre em todas aquelas atividades que podem incidir na aprendizagem de um determinado conteúdo. Trata-se de um conjunto de atividades que em alguns casos se concretiza em apenas uma unidade didática e em outros casos se estende ao longo de várias, ou inclusive de todas as unidades didáticas.

Para poder estabelecer as características desta unidade de análise - básica sobretudo nas áreas de caráter mais procedimental e para os conteúdos de caráter atitudinal e, também, portanto, para os conteúdos dos denominados eixos transversais e aqueles objetivos relacionados com a moral e a ética - proporemos um exemplo em que se utilizam sequências didáticas da unidade de tipo 4 ao longo de todo um curso.

Vamos nos situar na área de conhecimento do meio no ensino fundamental. Organizemos os conteúdos em quinze unidades, de forma que para cada uma corresponda duas semanas. As unidades são as seguintes: Unidade 1 - A paisagem; Unidade 2 - A vegetação; Unidade 3 - A hidrografia... Unidade 15 - A passagem do tempo. Dos possíveis conteúdos que serão abordados nas diversas unidades, iremos nos fixar somente em três: os componentes da paisagem, a interpretação e a realização de planos e mapas e a cooperação. Conteúdos fundamentalmente de caráter conceituai, procedimental e atitudinal, respectivamente.

O conteúdo conceituai "componentes da paisagem" será trabalhado especificamente na primeira unidade. Será realizada uma série de atividades de ensino com o objetivo de que ao final da unidade se tenha aprendido esse conteúdo. Teremos uma série de atividades com um princípio e um finai na própria unidade. No começo, os alunos desconhecem a maioria dos "componentes da paisagem", mas no final, se as atividades foram apropriadas, podem considerá-los aprendidos. Neste caso, temos uma sequência de atividades específicas para este conteúdo. Nas unidades posteriores utilizaremos estes conceitos e certamente ampliaremos e melhoraremos seu conhecimento, mas podemos considerar que as atividades fundamentais se desenvolveram na primeira unidade. Estas atividades são as que configurarão a sequência do conteúdo "componentes da paisagem".

O conteúdo procedimental "interpretação e realização de planos e mapas" já aparece na primeira unidade, que, pelo fato de estar localizada no começo do curso, implica um grau de exigência muito baixo. Nesta unidade será iniciado um trabalho de elaboração de planos e mapas que se estenderá ao longo de todo o curso, em diversas unidades. Assim, haverá muitas atividades que terão como objetivo o conhecimento e o domínio deste conteúdo. Este conjunto de atividades necessárias para sua aprendizagem constitui a sequência do conteúdo "interpretação e realização de planos e mapas".

O conteúdo atitudinal "cooperação" certamente já aparece na primeira unidade e em outras se toma um conteúdo essencial, seja pelo tema, seja pelas situações de trabalho e convivência que se propõem. Ao longo do curso, e em todas as unidades, haverá vivências ou experiências cruciais para a aprendizagem deste conteúdo. O conjunto destas atividades deverá garantir o alcance dos objetivos estabelecidos em relação à cooperação. Portanto, dentro do conjunto de atividades que ajudam uma formação cooperativa, será necessário observar aquelas que se realizam, explícita ou implicitamente, não apenas na área de conhecimento do meio, como nas demais-áreas e em outros momentos escolares. A sequência do conteúdo "cooperação" estará formada pelo conjunto de atividades, nas diferentes unidades didáticas das diferentes áreas ou fora delas, que incidem na formação de atitudes cooperativas.

Assim, podemos definir a unidade de análise que desenhamos como o conjunto ordenado de atividades estruturadas e articuladas para a consecução de um objetivo educacional em relação a um conteúdo concreto. Esta unidade de análise, como as sequências didáticas, está inserida num contexto em que se deverá identificar, além dos objetos didáticos e do conteúdo objeto da sequência; as outras variáveis metodológicas: relações interativas, organização social, materiais curriculares, etc.

Por tudo o que vimos a respeito destas sequências, a exemplo das didáticas, não nos interessa preliminarmente tanto a forma em que se desenvolve cada uma das atividades, mas estabelecer sua inserção ou não no conjunto de atividades, uma vez determinadas suas características. O que convém é examinar o sentido total da sequência e, portanto, o lugar que ocupa cada atividade e como se articula e estrutura nesta sequência, com o objetivo de prever quais são as atividades que é preciso modificar ou acrescentar.

Estas sequências serão mais ou menos complexas conforme o número de atividades envolvidas na aprendizagem de um conteúdo determinado, a duração da sequência 4e o número de unidades didáticas das quais fazem parte as diferentes atividades.

O ENSINO SEGUNDO AS CARACTERÍSTICAS TIPOLÓGÍCAS DOS CONTEÚDOS

Uma vez identificadas as sequências de conteúdo, o passo seguinte consiste em relacioná-las com o conhecimento que temos sobre os processos subjacentes à aprendizagem dos diferentes conteúdos, segundo sua tipologia. Isto nos permitirá estabelecer que condições de ensino devem

observar as sequências que encontramos representadas de maneira esquemática no Quadro 3.2, para cada um dos diferentes tipos de conteúdo.

Ensinar conteúdos factuais

No capítulo anterior já vimos que se aprendem os fatos mediante atividades de cópia mais ou menos literais, com o fim de integrá-los nas estruturas de conhecimento, na memória. O caráter reprodutivo dos fatos implica exercícios de repetição verbal. Repetir tantas vezes quanto seja necessário até que se consiga a automatização da informação. Assim, pois, as atividades básicas para as sequências de conteúdos factuais terão que ser aquelas que têm exercícios e repetição e, conforme a quantidade e a complexidade da informação, utilizem estratégias que reforcem as repetições mediante organizações significativas ou associações.

Esta simplificação da aprendizagem faz com que as sequências para estes conteúdos possam ser extremamente simples. Uma apresentação dos conteúdos sob um modelo expositivo, um estudo individual que consiste em exercícios de repetição e uma posterior prova pode ser suficientes; sempre com a condição de que cada uma destas fases cumpra uma série de requisitos para evitar que as aprendizagens estejam desvinculadas da capacidade de utilizá-las em outros contextos que não sejam os estritamente escolares. Desse modo, o modelo descrito na unidade 1 pode atender perfeitamente às condições para esta aprendizagem, sempre que a exposição consiga atrair o interesse dos alunos, que não haja um excesso de informação, que se conheçam e se tomem como ponto de partida os conhecimentos que já têm e, sobretudo, que os alunos disponham dos conhecimentos conceituais a que pertence cada um dos fatos: saber o que é um rio quando se aprendem os nomes dos rios ou uma corrente artística quando se memorizam suas obras mais representativas.

Quanto à atenção à diversidade, devemos levar em conta que numa aprendizagem de fatos, se os alunos são suficientemente maduros, a atenção sempre recai nos próprios alunos. São eles, e apenas eles, que terão que realizar as atividades de estudo, que, como vimos, são de repetição. Neste caso, levar em conta a diversidade dos alunos consiste em avaliar o número de atividades que deve realizar cada aluno para aprender o conteúdo e não a maneira de ensiná-lo. Uma vez exposto o conteúdo, para atender à diversidade o professor ou a professora só tem que estimular os meninos e meninas a que façam as atividades de memorização de que cada um necessita. Que cada aluno realize o número de exercícios que precisa é algo que não depende do professor. Portanto, o próprio aluno tem que exercitar por sua conta até que seja capaz de assimilar o conteúdo. De qualquer forma, será necessário propiciar um clima que favoreça a realização de determinados exercícios individuais que costumam ser bastante monótonos.

        Ensinar conceitos e princípios

Como os conceitos e princípios são temas abstratos, requerem uma compreensão do significado e, portanto, um processo de elaboração pessoal. Neste tipo de conteúdo são totalmente necessárias as diferentes condições estabelecidas anteriormente sobre a significância na aprendizagem: atividades que possibilitem o reconhecimento dos conhecimentos prévios, que assegurem a significância e a funcionalidade, que sejam adequadas ao nível de desenvolvimento, que provoquem uma atividade

mental, etc. As sequências de conteúdos conceituais têm que levar em conta todas elas. Portanto, a análise que fizemos anteriormente nos exemplos das quatro unidades é a adequada, já que, como vimos, a maioria destas sequências se situa numa mesma unidade didática.

Ensinar conteúdos procedimentais

Teremos que dedicar mais tempo a estes conteúdos, posto que a adaptação que devemos fazer das considerações gerais da aprendizagem significativa é mais complexa. Neste caso, o dado mais relevante é determinado pela necessidade de realizar exercícios suficientes e progressivos das diferentes ações que formam os procedimentos, as técnicas ou estratégias. Uma vez aceita essa informação, as sequências dos conteúdos procedimentais deverão conter atividades com algumas condições determinadas:

As atividades devem partir de situações significativas e funcionais, a fim de que o conteúdo possa ser aprendido junto com a capacidade de poder utilizá-lo quando seja conveniente. Por isto é imprescindível que este conteúdo tenha sentido para o aluno: ele deve saber para que serve e que função tem, ainda que seja útil apenas para poder realizar uma nova aprendizagem. Caso se desconheça sua função, ter-se-á aprendido o conteúdo procedimental, mas não será possível utilizá-lo quando se apresente a ocasião. Em geral estes conteúdos são trabalhados prescindindo de suas funções, se insiste às vezes em sua aprendizagem, mas não na finalidade a que estão ligados. Assim, encontramos trabalhos repetitivos e, portanto, esgotantes, cujo único sentido parece ser o domínio do conteúdo procedimental em si mesmo.

• A sequência deve contemplar atividades que apresentem os modelos de desenvolvimento do conteúdo de aprendizagem. Modelos onde se possa ver todo o processo, que apresentem uma visão* • completa das diferentes fases, passos ou ações que os compõem, para passar posteriormente, se a complexidade do modelo assim o requer, ao trabalho sistemático das diferentes ações que compreendem. Estes modelos deverão ser propostos unicamente quando se inicia o trabalho de aprendizagem, mas será necessário insistir neles em diferentes situações e contextos sempre que convenha.

• Para que a ação educativa resulte no maior benefício possível, é necessário que as atividades de ensino/aprendizagem se ajustem ao máximo a uma sequência clara com uma ordem de atividades que siga um processo gradual. Esta consideração é visível nos conteúdos mais algorítmicos como, por exemplo, o cálculo, onde o processo de mais simples para mais complexo é uma constante. Por outro lado, não é tão evidente na maioria dos outros conteúdos procedimentais. Um exemplo bastante evidente é o do ensino da observação. Hoje em dia, sobretudo nas áreas de Ciências Sociais e Naturais, se propõem atividades de observação de uma maneira sistemática. Mas se analisamos as características das atividades que se propõem ao longo das diferentes unidades didáticas, observamos que normalmente não respondem a uma determinada ordem de dificuldade. Existem algumas atividades e uma exercitação, mas não há uma ordem progressiva que facilite a aprendizagem além da simples repetição.

• São necessárias atividades com ajudas de diferente grau e prática guiada. A ordem e o progresso das sequências de ensino/aprendizagem, no caso dos conteúdos procedimentais, estarão determinados, na maioria das vezes, pelas características das ajudas que se irão dando ao longo da aplicação do conteúdo. Assim, em muitos casos, a estratégia mais apropriada, depois da apresentação do modelo, será a de proporcionar ajudas ao longo das diferentes ações e ir retirando-as progressivamente. Agora, a única maneira de decidir o tipo de ajuda que se deve dar e a oportunidade de mantê-la, modificá-la ou retirá-la consiste em observar e conduzir os alunos através de um processo de prática guiada, em que eles poderão ir assumindo, de forma progressiva, o controle, a direção e a responsabilidade da execução.

• Atividades de trabalho independente. Estreitamente ligado ao que comentávamos em relação ao ponto anterior, o ensino de conteúdos procedimentais exige que os meninos e meninas tenham a oportunidade de levar a cabo realizações independentes, em que possam mostrar suas competências no domínio do conteúdo aprendido. O trabalho independente, por um lado, é o objetivo que se persegue com a prática guiada e, por outro, se assume em sua verdadeira complexidade quando se aplica a contextos diferenciados.

Ensinar conteúdos atitudinais

As características dos conteúdos atitudinais, e o fato de que o componente afetivo atue de forma determinante em sua aprendizagem, fazem com que as atividades de ensino destes conteúdos sejam muito mais complexas que as dos outros tipos de conteúdo. O caráter conceituai dos valores, as normas e as atitudes, quer dizer, o conhecimento do que “cada um deles é e implica, pode ser aprendido mediante estratégias já descritas para os conteúdos conceituais. Agora, para que este conhecimento se transforme em referência de atuação é preciso mobilizar todos os recursos relacionados com o componente afetivo. O papel e o sentido que pode ter o valor solidariedade, ou o respeito às minorias, não se aprende apenas com o conhecimento do que cada uma destas ideias representa. As atividades de ensino necessárias têm que abarcar, junto com os campos cognitivos, os afetivos e condutuais, dado que os pensamentos, os sentimentos e o comportamento de uma pessoa não dependem só do socialmente estabelecido, como, sobretudo, das relações pessoais que cada um estabelece com o objeto da atitude ou do valor. Como bem se sabe, as intenções, neste âmbito, não coincidem indefectivelmente com as atuações.

E fundamental levar em conta não tanto os aspectos evidentes e

-Explícitos dos valores no momento das exposições, debates ou diálogos em que são tratados, como toda a rede de relações que se estabelece em aula: o tipo de interação entre professores e alunos, entre os próprios alunos e entre todos os membros da equipe docente. Estas relações e imagens, e as interpretações das condutas e comportamentos, serão algumas das peças-chave na configuração dos valores e das atitudes pessoais.

O fato de que estas inter-relações sejam um dos fatores determinantes supõe que é preciso prestar atenção a muitos dos aspectos que não se incluem de maneira manifesta nas unidades didáticas e que se referem aos aspectos organizativos e participativos. Muitos dos valores que se pretendem ensinar se aprendem quando são vividos de maneira natural; e isso só é possível quando o ambiente cie aula, as decisões organizativas, - as relações interpessoais, as normas de conduta, as regras de jogo e os papéis que se atribuem a uns e a outros correspondem àqueles valores que se quer que sejam aprendidos. A maneira de organizar as atividades e os papéis que cada um dos meninos e meninas deve assumir pode promover ou não atitudes como as de cooperação, tolerância e solidariedade.

Estas considerações exigem que se dê uma atenção especial à série de medidas que se toma na escola e que nunca foi objeto dos planos de ensino - o denominado currículo oculto posto que muitas atuações podem ser contraditórias com os propósitos estabelecidos nos objetivos educacionais da escola. Neste sentido, a manifestação explícita dos conteúdos em geral implícitos, e a reflexão pessoal e grupai dos professores e de todos os componentes da comunidade escolar, tornam-se algo fundamental.

E uma das primeiras medidas a se tomar é a de sensibilizar o aluno e do grupo-classe em geral. Como nos demais tipos de conteúdos, os conhecimentos prévios de que o aluno dispõe devem ser o ponto de partida, mas neste caso a medida tem que ser observada de forma muito mais "sutil". A interpretação que é preciso fazer dos diferentes valores deve levar muito mais em conta os traços socioculturais dos alunos, sua situação familiar e os valores que prevalecem em seu ambiente para que a interpretação dos diferentes valores se adapte às características de cada um dos contextos sociais em que se encontram as escolas. Partir da realidade e aproveitar os conflitos que nela se apresentam tem que ser o fio condutor do trabalho destes conteúdos. Aproveitar as experiências vividas pelos alunos e os conflitos ou pontos de vista contrários que apareçam nestas vivências ou na dinâmica da aula, a fim de promover o debate e a reflexão sobre os valores que decorrem das diferentes atuações ou pontos de vista. Propor situações que ponham em conflito os conhecimentos, as crenças e os sentimentos de forma adaptada ao nível de desenvolvimento dos alunos, sobre as normas existentes na escola e na aula, com o objetivo de que compreenda sua necessidade e de que, a partir da reflexão e da análise, não apenas as aceite, mas as respeite como suas. Essa finalidade requer a promoção da participação ativa do aluno, fugindo do verbalismo e potencializando o intercâmbio entre os alunos para debater as opiniões e ideias sobre tudo o que os afeta em seu trabalho nas aulas e na escola, pedindo, ao mesmo tempo, compromissos derivados dos valores e atitudes aceitos livremente. Esse processo deve permitir que os meninos e meninas se sintam protagonistas de suas aprendizagens e agentes na formulação das propostas de convivência e trabalho, mediante a promoção da aceitação e da internalização das concepções e avaliações das atitudes a serem promovidas, participando no controle do processo e dos resultados.

Neste sentido a assembleia de alunos como recurso didático pode responder às necessidades de participação na formação dos valores que queremos que governem a escola. A introdução do caráter público que a assembleia representa faz com que os compromissos pessoais tenham uma implicação condutual, emocional e cognitiva diante dos demais, o que possibilita que o grupo-classe, e não apenas os professores, possa colaborar na regulação dos compromissos adquiridos.

Além destes critérios de caráter geral, nas sequências de aprendizagem para estes conteúdos, em cada unidade didática e no curso das diferentes unidades, será preciso levar em conta uma série de medidas:

* Adaptar o caráter dos conteúdos atitudinais às necessidades e situações reais dos alunos, levando em conta, ao defini-las, as características, os interesses e as necessidades pessoais de cada um deles

* Introduzir processos de reflexão crítica para que as normas sociais de convivência integrem as próprias normas. É preciso ajudar os alunos a relacionar estas normas com determinadas atitudes que se queiram desenvolver em situações concretas e promover a reflexão crítica acerca dos contextos históricos e institucionais nos quais se manifestam estes valores.

Favorecer modelos das atitudes que se queiram desenvolver, não apenas por parte dos professores, incentivando e promovendo comportamentos coerentes com estes modelos. Desenvolver atividades que façam com que os alunos participem em processos de mudança atitudinal, pondo em crise suas próprias proposições. Incentivar e ajudar para que ensaiem e provem as mudanças que em muitos casos serão necessárias, favorecendo o apoio dos colegas nestas mudanças e promovendo as avaliações adequadas ao trabalho realizado e aos êxitos alcançados.

Fomentar a autonomia moral de cada aluno, o que implica não apenas que os professores estabeleçam espaços para colocá-la em prática, como também que criem nos alunos espaços de experimentação dos processos de aquisição que permitam esta autonomia.

Conclusões

Neste capítulo pudemos ver que a partir de nossas propostas de trabalho aparecem, para os alunos, diferentes oportunidades de aprender diversas coisas e, para nós como educadores, uma diversidade de meios para captar os processos de construção que eles edificam, de possibilidades de neles incidir e avaliá-los. Também observamos que os diferentes conteúdos que apresentamos aos meninos e meninas exigem esforços de aprendizagem e ajudas específicas. Nem tudo se aprende do mesmo modo, no mesmo tempo nem com o mesmo trabalho. Discernir o que pode ser objeto de uma unidade didática, como conteúdo prioritário, do que exige um trabalho mais continuado, ao longo de diversas unidades e, inclusive, em áreas e situações escolares diversificadas, talvez seja um exercício ao qual não estamos suficientemente acostumados, mas nem por isso é menos necessário. Quantas vezes nos mostramos

perplexos porque nossos alunos esqueceram a realização de um procedimento? Quantas vezes nos perguntamos como é possível que não sejam capazes de utilizar o que sabem fazer numa área quando lhes é apresentado um problema numa área diferente? Por que nosso desejo de que sejam tolerantes e respeitosos se vê frustrado justamente naquelas ocasiões em que é mais necessário exercer a tolerância e o respeito? Como pode ser que os conceitos que pareciam seguros não resistam ao embate das mínimas contradições?

A resposta que atribui estes fatos exclusivamente a características dos alunos não deveria nos tranquilizar, embora seja lógico que a utilizemos, se não temos outras. Em minha opinião, refletir sobre o que implica aprender o que propomos, e o que implica aprendê-lo de maneira significativa, pode nos conduzir a estabelecer propostas mais fundamentadas, suscetíveis de ajudar mais os alunos e ajudar nós mesmos. As contribuições deste capítulo pretendem, por um lado, oferecer elementos para esta reflexão e, por outro, demonstrar que as diferentes propostas didáticas que oferecemos de maneira mais ou menos consciente têm diferentes potencialidades. Em resumo, o que queremos dizer é que mais do que nos movermos pelo apoio acrítico a um ou outro modo de organizar o ensino, devemos dispor de critérios que nos permitam considerar o que é mais conveniente num dado momento para determinados objetivos a partir da convicção de que nem tudo tem o mesmo valor, nem vale para satisfazer as mesmas finalidades. Utilizar estes critérios para analisar nossa prática e, se convém, para reorientá-la em algum sentido, pode representar, em princípio, um esforço adicional, mas o que é certo é que pode evitar perplexidades e confusões posteriores.

Antoni Zabala – A Prática Educativa


Zabala - As relações interativas em sala de aula

 

Neste capítulo examinaremos como a concepção construtivista do ensino e da aprendizagem e a natureza dos diferentes conteúdos estabelecem determinados parâmetros nas atuações e relações que acontecem em aula. Tomadas como referenciais, permitirão nos aprofundar no conhecimento das diferentes propostas didáticas e de nossa forma de intervenção. Faremos uma revisão sintética do tipo de inter-relações e do papel dos professores e dos alunos que decorre da concepção construtivista, para em seguida examinarmos cada um dos diferentes aspectos que a configuram. Na última parte do capítulo faremos referência às características específicas dos conteúdos tratados.

Segundo esta concepção, ensinar envolve estabelecer uma série de relações que devem conduzir à elaboração, por parte do aprendiz, de representações pessoais sobre o conteúdo objeto de aprendizagem. A pessoa, no processo de aproximação aos objetos da cultura, utiliza sua experiência e os instrumentos que lhe permitem construir uma interpretação pessoal e subjetiva do que é tratado. Não é necessário insistir no fato de que em cada pessoa o resultado deste processo será diferente, trará coisas diferentes, e a interpretação que irá fazendo da realidade também será diferente; apesar de possuir elementos compartilhados com os outros, terá determinadas características únicas e pessoais.

Assim, pois, a diversidade é inerente à natureza humana, e qualquer atuação encaminhada para desenvolvê-la tem que se adaptar a esta caraterística. Falamos, portanto, de um "ensino adaptativo" (Miras, 1991), cuja característica distintiva é sua capacidade para se adaptar às diversas necessidades das pessoas que o protagonizam. Esta característica se concretiza em todas as variáveis que estão presentes nas diferentes estratégias que podem ser postas em marcha para "operacionalizar" a influência educativa.

Portanto, podemos falar da diversidade de estratégias que os professores podem utilizar na estruturação das intenções educacionais com seus alunos. Desde uma posição de intermediário entre o aluno e a cultura, a atenção à diversidade dos alunos e das situações necessitará, às vezes, desafiar; às vezes, dirigir; outras vezes, propor, comparar. Porque os meninos e as meninas, e as situações em que têm que aprender, são diferentes.

Isto tudo sugere que a interação direta entre alunos e professor tem que permitir a este, tanto quanto for possível, o acompanhamento dos processos que os alunos e alunas vão realizando na aula. O acompanhamento e uma intervenção diferenciada, coerentes com o que desvelam, tornam necessária a observação do que vai acontecendo. Não se trata de uma observação "desde fora", mas de uma observação ativa, que também permita integrar os resultados das intervenções que se produzam. Portanto, na boa lógica construtivista, parece mais adequado pensar numa organização que favoreça as interações em diferentes níveis: em relação ao grupo-classe, quando de uma exposição; em relação aos grupos de alunos, quando a tarefa o requeira ou o permita; interações individuais, que permitam ajudar os alunos de forma mais específica; etc. Assim se favorece a possibilidade de observar, que é um dos pontos em que se apoia a intervenção. O outro ponto de apoio é constituído pela plasticidade, a possibilidade de intervir de forma diferenciada e contingente nas necessidades dos alunos.

Uma interpretação construtivista do ensino se articula em torno do princípio da atividade mental dos alunos - e, portanto, também da diversidade. Apesar disso, situar no eixo o aluno ativo não significa promover uma atividade compulsiva, reativa, tampouco situar os professores num papel secundário.

Promover a atividade mental auto estruturante, que possibilita estabelecer relações, a generalização, a descontextualização e a atuação autônoma, supõe que o aluno entende o que faz e por que o faz e tem consciência, em qualquer nível, do processo que está seguindo. Isto é o que lhe permite dar-se conta de suas dificuldades e, se for necessário, pedir ajuda. Também é o que lhe permite experimentar que aprende, o que, sem dúvida, o motiva a seguir se esforçando.

Mas que isto aconteça não é uma casualidade. Que o aluno compreenda o que faz depende, em boa medida, de que seu professor ou professora seja capaz* de ajudá-lo a compreender, a dar sentido ao que tem entre as mãos; quer dizer, depende de como se apresenta, de como tenta motivá-lo, na medida em que lhe faz sentir que sua contribuição será necessária para aprender. O fato de que possa estabelecer relações depende, também, do grau em que o professor lhe ajuda a recuperar o que possui e destaca os aspectos fundamentais dos conteúdos que se trabalham e que oferecem mais possibilidades de relacionar com. o que conhece. Evidentemente, também depende da organização dos conteúdos, que os torne mais ou menos funcionais. Que os meninos e meninas possam seguir o processo e situar-se nele depende também do grau de contribuição do professor, com sínteses e recapitulações, com referências ao que já se fez e ao que resta por fazer; os critérios que pode transmitir acerca do que constitui uma relação adequada contribui, sem dúvida, para que os alunos possam avaliar a própria competência, aproveitar as ajudas que lhes são oferecidas e, se for necessário, pedi-las.

É todo um conjunto de interações baseadas na atividade conjunta dos alunos e dos professores, que encontram fundamento na zona de desenvolvimento proximal, que, portanto, vê o ensino como um processo de construção compartilhada de significados, orientados para a autonomia do aluno, e que não opõe a autonomia - como resultado de um processo - à ajuda necessária que este processo exige, sem a qual dificilmente se poderia alcançar com êxito a construção de significados deveriam caracterizar a aprendizagem escolar.

A INFLUÊNCIA DA CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA NA FORMA DE AÇÃO DAS INTERAÇÕES EDUCATIVAS NA AULA

Do conjunto de relações interativas necessárias para facilitar a aprendizagem se deduz uma série de funções dos professores, que tem como ponto de partida o próprio planejamento. Podemos caracterizar         pessoas funções da seguinte maneira:

a) Planejar a atuação docente de uma maneira suficientemente flexível para permitir a adaptação às necessidades dos alunos em todo o processo de ensino/aprendizagem.

b) Contar com as contribuições e os conhecimentos dos alunos, tanto no início das atividades como durante sua realização.

c) Ajudá-los a encontrar sentido no que estão fazendo para que conheçam o que têm que fazer, sintam que podem fazê-lo e que é interessante fazê-lo.

d) Estabelecer metas ao alcance dos alunos para que possam ser superadas com o esforço e a ajuda necessários.

e)  Oferecer ajudas adequadas, no processo de construção do aluno, para os progressos que experimenta e para enfrentar os obstáculos com os quais se depara.

f) Promover atividade mental auto estruturante que permita estabelecer o máximo de relações com o novo conteúdo, atribuindo-lhe significado no maior grau possível e fomentando os processos de meta- cognição que lhe permitam assegurar o controle pessoal sobre os próprios conhecimentos e processos durante a aprendizagem.

g)  Estabelecer um ambiente e determinadas relações presididos pelo respeito mútuo e pelo sentimento de confiança, que promovam a autoestima e o autoconceito.

h)  Promover canais de comunicação que regulem os processos de negociação, participação e construção.

i) Potencializar progressivamente a autonomia dos alunos na definição de objetivos, no planejamento das ações que os conduzirão a eles e em sua realização e controle, possibilitando que aprendam a aprender.

j) Avaliar os alunos conforme suas capacidades e seus esforços, levando em conta o ponto pessoal de partida e o processo através do qual adquirem conhecimento e incentivando a autoavaliação das competências como meio para favorecer as estratégias de controle e regulação da própria atividade.

Planejamento e plasticidade na aplicação

A complexidade dos processos educativos faz com que dificilmente se possa prever com antecedência o que acontecerá na aula. Agora, este mesmo inconveniente é o que aconselha que os professores contem com o maior número de meios e estratégias para poder atender às diferentes demandas que aparecerão no transcurso do processo de ensino/ aprendizagem. Este fato recomenda duas atuações aparentemente contraditórias: por um lado, poder contar com uma proposta de intervenção suficientemente elaborada; e por outro, simultaneamente, com uma aplicação extremamente plástica e livre de rigidez. Trata-se de uma aplicação que nunca pode ser o resultado da improvisação, já que a própria dinâmica da aula e a complexidade dos processos grupais de ensino/aprendizagem obrigam a dispor previamente de um leque amplo de atividades que ajudem a resolver os diferentes problemas que a prática educativa coloca.

É imprescindível prever propostas de atividades articuladas e situações que favoreçam diferentes formas de se relacionar e interagir: distribuições grupais, com organizações internas convenientemente estruturadas através de equipes fixas e móveis com atribuições de responsabilidades claramente definidas; espaços de debate e comunicação espontâneos e regrados, como resultado da resolução de um conflito determinado nas assembleias periódicas; trabalhos de campo, excursões e visitas que situem os alunos frente à necessidade de resolver situações de convivência diferentes das que habitualmente lhes oferece a escola, a família ou o grupo de amigos; conjuntos de atividades e tarefas que gerem e favoreçam uma multiplicidade de situações comunicativas e de inter-relação que possam ser orientadas e utilizadas educativamente por parte dos professores.

Ao mesmo tempo, o planejamento tem que ser suficientemente diversificado para incluir atividades e momentos de observação do processo que os alunos seguem. É preciso propor aos alunos exercícios e atividades que ofereçam o maior número de produções e condutas para que sejam processadas, a fim de que oportunizem todo tipo de dados sobre as ações a empreender. Mover-se nos parâmetros de referências metodológicas extremamente abertas à participação do aluno para conhecer o processo que cada um segue. Procurar fórmulas organizativas que permitam a atenção individualizada, o que implica o planejamento estruturado de atividades em pequenos grupos ou individualmente, para que exista a possibilidade de atender a alguns alunos enquanto os demais estão ocupados em suas tarefas. Tudo isso deve permitir a individualização do tipo de ajuda, já que nem todos aprendem da mesma forma nem. no mesmo ritmo e. portanto, tampouco o fazem com as mesmas atividades.

Tem que ser um planejamento suficientemente flexível para poder se adaptar às diferentes situações da aula, como também deve levar em conta as contribuições dos alunos desde o princípio. É importante que possam participar na tomada de decisões sobre o caráter das unidades didáticas e a forma de organizar as tarefas e seu desenvolvimento, a fim de que não apenas aumentem o nível de envolvimento no ritmo da classe em geral, como em seus próprios processos de aprendizagem, entendendo o porquê das tarefas propostas e responsabilizando-se pelo processo autônomo de construção do conhecimento.

Quer dizer, um planejamento como previsão das intenções e como plano de intervenção, entendido como um marco flexível para a orientação do ensino, que permita introduzir modificações e adaptações, tanto no planejamento mais a longo prazo como na aplicação pontual, segundo o conhecimento que se vá adquirindo através das manifestações e produções dos alunos, sou acompanhamento constante e a avaliação continuada de seu progresso.

Levar em conta as contribuições dos alunos tanto no início das atividades como durante o transcurso das mesmas

Para poder estabelecer os vínculos entre os novos conteúdos e os conhecimentos prévios, em primeiro lugar é preciso determinar que interesses, motivações, comportamento, habilidades, etc., devem constituir o ponto de partida. Para conseguir que os alunos se interessem é preciso que os objetivos de saber, realizar, informar-se e aprofundar sejam uma consequência dos interesses detectados; que eles possam saber sempre o que se pretende nas atividades que realizam e que sintam que o que fazem satisfaz alguma necessidade. Mas para isso é indispensável que os meninos e meninas tenham a oportunidade de expressar suas próprias ideias e, a partir delas, convém potencializar as condições que lhes permitam revisar a fundo estas ideias e a ampliar as experiências com outras novas, fazendo com que se deem conta, também, de suas limitações, situando-os em. condição de modificá-las se for necessário, ao mesmo tempo que se buscam outras alternativas.

Estas condições obrigam a que uma das primeiras tarefas dos professores consista em levar em conta os conhecimentos prévios dos meninos e meninas, não aperras em relação aos conteúdos, como também aos papéis de todas as instâncias que participam nos processos de ensino/aprendizagem e, portanto, é preciso examinar a disposição, os recursos e as capacidades gerais com que conta cada aluno em relação à . tarefa proposta.

Para conseguir esta informação, será necessário, em primeiro lugar gerar um ambiente em que seja possível que os alunos se abram, façam

perguntas e comentem o processo que seguem, através de situações de diálogo e participação, como meio para a exploração dos conhecimentos prévios.

Para que tudo isto possa se realizar, os professores devem acreditar sinceramente nas capacidades dos alunos, ganhando a confiança deles a partir do respeito mútuo. Tem que avaliar o aluno pelo que é, confiando nele e dando condições para que aprenda a confiar em si mesmo. Neste sentido, dado o importante papel que desempenham as expectativas dos professores para com os alunos, será preciso encontrar em todos os alunos aspectos positivos (posto que sem dúvida existem) e que as expectativas se expressem convenientemente. Os alunos respondem e se adaptam de maneira diversa às propostas educacionais, mostrando maior ou menor interesse e dedicação nas tarefas, entre outros motivos, em função do que se espera, o que influi na intervenção do professor. Assim, aqueles que sentem que se espera deles um bom rendimento e que receberam ajuda e atenção por parte do professor, provavelmente confirmarão as expectativas gerais; por sua parte, meninos e meninas dos quais se esperavam poucos êxitos e que podem ter recebido uma ajuda educacional de menor qualidade também responderão às expectativas geradas ao não encontrar as condições apropriadas para melhorar seu rendimento (Solé, 1993).

Para poder levar em conta as contribuições dos alunos, além de criar o clima adequado, é preciso realizar atividades que promovam o debate sobre suas opiniões, que permitam formular questões e atualizar o conhecimento prévio, necessário para relacionar uns conteúdos com outros. Quer dizer, apresentar os conteúdos relacionados com o que já sabem, com seu mundo experiencial, estabelecendo, ao mesmo tempo, certas propostas de atuação que favoreçam a observação do processo que os alunos seguem para poder assegurar que seu nível de envolvimento é o adequado. Sem este ponto de partida, dificilmente será possível determinar os passos seguintes.

Ajudá-los a encontrar sentido no que fazem

Para que os alunos vejam sentido no trabalho que irão realizar é necessário que conheçam previamente as atividades que devem desenvolver, não apenas como são, como também o motivo pelo que foram selecionadas essas e não outras; que sintam que o trabalho que lhes é proposto está ao alcance deles e que seja interessante fazê-lo. Levando em conta estas condições, será necessário ajudar os meninos e meninas para que saibam o que têm que se fazer, a que objetivos responde, que finalidade se persegue, com que se pode relacionar e em que projeto global pode se inserir. Trata-se de condições não muito habituais, dada a tendência a dar por bom e inquestionável, e, portanto, com certo grau de imposição, o trabalho escolar e determinados conteúdos, também como resposta às demandas, muitas vezes arbitrárias, dos programas oficiais. É habitual encontrar propostas de exercícios em que os alunos atuam sem ter outra visão do trabalho do que a exclusiva resolução pontual da atividade. Dificilmente pode se produzir uma aprendizagem profunda se não existe uma percepção das razões que a justificam, além da necessidade de superação de alguns exames.

Assim, pois, será necessário comunicar os objetivos das atividades aos alunos, ajudá-los a ver de forma clara os processos e os produtos que se espera que adquiram ou produzam, introduzindo, no maior grau possível, a atividade pontual no âmbito de marcos ou objetivos mais amplos, a fim de que esta atividade adquira um significado adequado. É condição indispensável que vejam a proposta como atrativa, que estejam motivados para realizar o esforço necessário para alcançar as aprendizagens. Vale a pena considerar que, em geral, é preciso provocar o interesse e que este exige atenção para que ao longo do processo de aprendizagem não se dilua. Assim, é fundamental ajudar a tomar consciência dos próprios interesses e buscar o interesse geral, assim como aproveitar a participação e o envolvimento no planejamento, organização e realização de todas as atividades que se desenvolvem em classe, como meio para assegurar que o que fazem responde a uma necessidade.

De qualquer forma, não se deve esquecer que o melhor incentivo ao interesse é experimentar que se está aprendendo e que pode se aprender. A percepção de que a gente mesmo é capaz de aprender atua como requisito imprescindível para atribuir sentido a uma tarefa de aprendizagem. A maneira de ver o aluno e de avaliá-lo é essencial na manifestação do interesse por aprender. O aluno encontrará o campo seguro num clima propício para aprender significativamente, num clima em que se valorize o trabalho que se faz, com explicações que o estimulem a continuar trabalhando, num marco de relações em que predomine a aceitação e a confiança, num clima que potencializa o interesse por empreender e continuar o processo pessoal de construção do conhecimento.

Estabelecer metas alcançáveis

Para aprender não basta que o aluno participe na definição dos objetivos e no planejamento das atividades se estes objetivos e  atividades não representam, em primeiro lugar, desafios que o ajudem a avançar e, em segundo, se não são metas a seu alcance.

Será necessário provocar desafios que questionem os conhecimentos prévios e possibilitem as modificações necessárias na direção desejada, segundo os objetivos educacionais estabelecidos. Isto quer dizer que o ensino não deve se limitar ao que o aluno já sabe, mas que a partir deste conhecimento tem que conduzi-lo à aprendizagem de novos conhecimentos, ao domínio de novas habilidades e à melhora de comportamentos já existentes, pondo-o em situações que o obriguem a realizar um esforço de compreensão e trabalho.

Agora, os desafios têm que ser alcançáveis, já que um desafio tem sentido para o aluno quando este sente que com seu esforço e a ajuda necessária pode enfrentá-lo e superá-lo. Nesse momento sua tarefa será significativa. Assim, é necessário prestar atenção à adequação entre as- propostas e as possibilidades reais de cada menino e menina. Esta necessidade de adequação diversificada dos desafios obriga a questionar a excessiva homogeneidade das propostas que facilmente, pelo fato de implicar para todos o mesmo trabalho, podem excluir aqueles que não encontrem sentido num processo que, supostamente, não lhes trará nenhuma satisfação. Também induz a pensar que a diversificação se estende à maneira de responder dos diferentes alunos: uns com mais facilidade, outros com mais dificuldade; uns mais autonomamente, outros com necessidade de mais ajuda ou de uma ajuda qualitativamente diferente.

Oferecer ajudas contingentes

A elaboração do conhecimento exige o envolvimento pessoal, o tempo e o esforço dos alunos, assim como ajuda especializada, estímulos e afeto por parte dos professores e dos demais colegas. Ajuda pedagógica ao processo de crescimento e construção do aluno para incentivar os progressos que experimenta e superar os obstáculos que encontra. Ajuda necessária, porque sem ela os alunos por si sós dificilmente conseguiriam aprender, e aprender o mais significativamente possível. Mas sabendo, ao mesmo tempo, que deve ser só ajuda, já que o ensino não pode substituir os processos singulares e individuais que deve seguir cada um dos meninos e meninas em sua formação como pessoas.

Oferecer ajudas contingentes supõe intervir e oferecer apoio em atividades ao alcance dos meninos e meninas para que, graças ao esforço no trabalho e a estas ajudas, possam modificar os esquemas de conhecimento e atribuir novos significados e sentidos que lhes permitam adquirir progressivamente mais possibilidades de atuar de forma autônoma e independente em situações novas e cada vez mais complexas.

O apoio e a assistência que têm que acompanhar as exigências e os desafios devem ser instrumentos de todo tipo, tanto intelectuais como emocionais. Ajudas que se refletirão nas características das tarefas e na organização das mesmas e do grupo/classe em geral, de forma que seja possível a intervenção individualizada dos professores, e também como medidas ligadas ao tipo de avaliação, mas fundamentalmente vinculadas à maneira de comunicar e manifestar o conhecimento sobre o processo e os resultados alcançados.

Dada a diversidade dos alunos, o ensino não pode se limitar a proporcionar sempre o mesmo tipo de ajuda nem intervir da mesma maneira em cada um dos meninos e meninas. É preciso diversificar os tipos de ajuda; fazer perguntas ou apresentar tarefas que requeiram diferentes níveis de raciocínio e realização; possibilitar, sempre, respostas positivas, melhorando-as quando inicialmente são mais insatisfatórias; não tratar de forma diferente os alunos com menos rendimento; estimular constantemente o progresso pessoal. Mas também é imprescindível diversificar as atividades, a fim de que os alunos possam escolher entre tarefas variadas e propor diversas atividades com diferentes opções ou níveis possíveis de realização.

Para que tudo isso seja possível é preciso tomar medidas de organização do grupo, de tempo e de espaço e, ao mesmo tempo, de organização dos próprios conteúdos, que possibilitem a atenção às necessidades individuais. Agrupamentos flexíveis, equipes fixas ou variáveis, trabalho individual, oficinas e "cantos", contratos de trabalho, etc., com o objetivo de dispor de tempo e oportunidades para proporcionar em todo

momento a ajuda de que cada aluno necessita. Organização dos conteúdos que possibilite um trabalho adequado às características experimentais e pessoais dos alunos, oferecendo diversos graus de compreensão que permitam distintas aproximações ao conhecimento e diferentes níveis de utilização dos conteúdos de aprendizagem.

Promover a atividade mental auto-estruturante

Aprender significa elaborar uma representação pessoal do conteúdo objeto da aprendizagem, fazê-lo seu, interiorizá-lo, integrá-lo nos próprios esquemas de conhecimento. Esta representação não inicia do zero, mas parte dos conhecimentos que os alunos já têm e que lhes permitem fazer conexões com os novos conteúdos, atribuindo-lhes certo grau de significância. As relações necessárias a estabelecer não se produzem automaticamente - são o resultado de um processo extrema mente ativo realizado pelo aluno, o que há de possibilitar a organização e o enriquecimento do próprio conhecimento. Atividade que não significa fazer coisas indiscriminadamente, quer dizer, fazer por fazer - erro que cometem muitas propostas progressistas baseadas na simples realização de atividades em que o aluno está em constante movimento -, mas ações que promovam uma intensa atividade de reflexão sobre o que propõem as aprendizagens, diretamente proporcional a sua complexidade e dificuldade de compreensão. No entanto, é óbvio que para que esta atividade possa ter lugar, e segundo o nível de conhecimento cognitivo, os meninos e meninas terão que ver, tocar, experimentar, observar, manipular, exemplificar, comparar, etc., e a partir destas ações será possível ativar os processos mentais que lhes permitam estabelecer as relações necessárias para a atribuição de significado. Atividade mental que não pode se limitar à ação compreensiva exclusiva, pois para que essa aprendizagem seja o mais profunda possível, será necessário que,-além disso, exista uma reflexão sobre o próprio processo de aprendizagem.

Para poder realizar este processo mental auto-estruturante, os meninos e meninas necessitam de uma série de estratégias metacognitivas que lhes possibilite assegurar o controle pessoal dos conhecimentos que vão construindo, assim como dos processos que se realizam na aprendizagem. Poderemos considerar que existe um controle pessoal quando se dispõem de estratégias que lhes oferecem a oportunidade de planejar as atividades, regular as atuações, a partir dos resultados que obtêm durante sua realização, e revisar e avaliar a efetividade das ações desenvolvidas.

Esta intensa atividade mental não se realiza facilmente. É preciso que os meninos e meninas sintam a necessidade de se fazer perguntas, de questionar suas ideias, de estabelecer relações entre fatos e acontecimentos, de revisar suas concepções. E para promover todas estas ações será necessário propor aquelas atividades que possibilitem este intenso processo mental. Aqui é preciso considerar a complexidade do conteúdo objeto de aprendizagem e as capacidades de que dispõem os alunos para compreendê-lo e dominá-lo, para planejar as atividades que favoreçam e promovam o esforço mental necessário para estabelecer vínculos entre suas concepções e o novo material de aprendizagem. Conforme as dificuldades do novo conteúdo, haverá que oferecer atividades nas quais os meninos e meninas se sintam cômodos em relação ao processo de compreensão e, portanto, será necessário partir de situações o mais próximas possível do seu mundo experiencial, através de atividades que apresentem referenciais que favoreçam este processo de compreensão. Convém levar em conta que em muitos casos não poderão ser unicamente atividades passivas, serão necessários o debate e o diálogo, quando não os trabalhos de observação, experimentação e manipulação.

Atividades que exigem dos alunos, além do mais, aplicar, analisar, sintetizar e avaliar o trabalho realizado e a eles mesmos; que promovam a reflexão conjunta dos processos seguidos, ajudando-os a pensar, para que sejam constantemente partícipes das próprias aprendizagens. Atividades que fomentem a tomada de decisões quanto às aprendizagens que devem ser realizadas, levando em conta o ponto pessoal de partida; que tornem possível pôr sobre a mesa as habilidades que utilizarão ou requererão; que orientem seus pensamentos mediante a interrogação e a formulação de hipóteses, solicitando aos alunos explicações sobre seus I próprios processos e sobre o processo a partir do qual chegam ao conhecimento e utilizando a linguagem para a generalização em diferentes situações e contextos e a reconceitualização das experiências vividas.

Verbalização também em situações de atividade compartilhada com outros e na resolução de problemas de maneira cooperativa, que permitam, a confrontação de ideias, a resolução de dúvidas e o uso funcional em outras ocasiões em que seja necessário.

Estabelecer um ambiente e determinadas relações que facilitem a auto-estima e o autoconceito

Para aprender é indispensável que haja um clima e um ambiente adequados, constituídos por um marco de relações em que predominem a aceitação, a confiança, o respeito mútuo e a sinceridade. A aprendizagem é potencializada quando convergem as condições que estimulam o trabalho e o esforço. E preciso criar um ambiente seguro e ordenado, que ofereça a todos os alunos a oportunidade de participar, num clima com multiplicidade de interações que promovam a cooperação e a coesão do grupo, interações essas presididas pelo afeto, que contemplem a possibilidade de se enganar e realizar as modificações oportunas; onde convivam a exigência de trabalhar e a responsabilidade de realizar o trabalho autonomamente, a emulação e o companheirismo, a solidariedade e o esforço; determinadas interações que gerem sentimentos de segurança e contribuam para formar no aluno uma percepção positiva e ajustada de si mesmo.

E isto é assim porque na aprendizagem intervêm numerosos aspectos do tipo afetivo e relacional, de maneira que o processo seguido e os resultados obtidos adquirem um papel definitivo na construção do conceito que se tem de si mesmo, na maneira de se ver e se avaliar e, em geral, no autoconceito. Ao mesmo tempo, este autoconceito influi na maneira de se situar frente à aprendizagem: com mais ou menos segurança, ilusão, expectativas.

Uma das tarefas dos professores consistirá em criar um ambiente motivador, que gere o autoconceito positivo dos meninos e meninas, a confiança em sua própria competência para enfrentar os desafios que se apresentem na classe. Estas representações serão o resultado do grau de adequação dos desafios que são propostos aos alunos e da avaliação que se faz de seu trabalho. Como já se disse, as características das atividades que se propõem serão essenciais, mas o que determina em maior ou menor grau a própria imagem serão os tipos de comentários de aceitação ou de rejeição por parte dos professores durante as atividades e, sobretudo, o papel que se atribui à avaliação. Assim, pois, as avaliações centradas exclusivamente nos resultados, e especialmente em relação a alguns objetivos gerais ou à média da classe, não ajudarão em absoluto a melhorar a auto-imagem de todos aqueles que, apesar do esforço realizado, não conseguem superar esta média. Para manter e melhorar uma auto-imagem que facilite a atitude favorável à aprendizagem, será necessário que estas avaliações sejam feitas conforme as possibilidades reais de cada um dos meninos e meninas, para que a aceitação das competências pessoais não ocorra cm detrimento de uma auto-imagem positiva.

Promover canais de comunicação

Entender a educação como um processo de participação orientado, de — construção conjunta, que leva a negociar e compartilhar significados, faz com que a rede comunicativa que se estabelece na aula, quer dizer, o tecido de interações que estruturam as unidades didáticas, tenha uma importância crucial. Para construir esta rede, em primeiro lugar é necessário compartilhar uma linguagem comum, entender-se, estabelecer canais fluentes de comunicação e poder intervir quando estes canais não funcionem. Utilizar a linguagem da maneira mais clara e explícita possível, tratando de evitar e controlar possíveis mal-entendidos ou incompreensões.

Para facilitar o desenvolvimento do aluno é preciso utilizar o grupo- classe, potencializando o maior número de intercâmbios em todas as direções. Para isso será imprescindível promover a participação e a relação entre os professores e os alunos e entre os próprios alunos, para debater opiniões e ideias sobre o trabalho a ser realizado e sobre qualquer das atividades que se realizam na escola, escutando-os e respeitando o direito de intervirem nas discussões e nos debates. E importante aceitar as contribuições dos meninos e meninas, mesmo que se expressem de forma pouco clara ou parcialmente incorreta, e estimular especificamente a participação dos alunos com menor tendência espontânea a intervir, através do oferecimento de espaços de trabalho em pequenos grupos ou da relação e de contato pessoais com alguns alunos em momentos pontuais. A diversificação dos tipos de atividades para tornar possível que num momento determinado os alunos possam escolher entre atividades diferentes e a proposição, em alguns casos, de atividades com opções ou alternativas diferentes para possibilitar a participação do conjunto de alunos no maior grau possível.

A rede comunicativa será mais ou menos rica conforme as possibilidades veiculadas pelas diferentes sequências didáticas e as que se decorrem do tipo de estruturação do grupo e do papel que outorga aos diversos membros do grupo. Pode se escolher uma estrutura praticamente linear, cujas relações sejam fundamentalmente unidirecionais de professor a aluno e cujos níveis de comunicação se limitem a uma aceitação acrítica das exposições e critérios do primeiro. Ou também se pode promover que os canais comunicativos, e, portanto, da aprendizagem, se ampliem graças a modelos cuja estrutura organizativa obrigue a corresponsabilizar todo o grupo-classe com o objetivo de conviver e aprender e, assim, abrir o leque de possibilidades de relações entre os diferentes membros do grupo. Atividades comunicativas que fomentem a bidirecionalidade das mensagens e aproveitem a potencialidade educativa que oferece a aprendizagem entre iguais.

Potencializar a autonomia e possibilitar que os alunos aprendam a aprender

O crescimento pessoal dos alunos implica como objetivo último serem autônomos para atuar de maneira competente nos diversos contextos em que haverão de se desenvolver. Impulsionar esta autonomia significa tê-la presente em todas e cada uma das propostas educativas, para serem capazes de utilizar sem ajuda os conhecimentos adquiridos em situações diferentes da que foram aprendidos. Para poder alcançar esta autonomia será necessário que ao longo de todas as unidades didáticas os professores e os alunos assumam responsabilidades distintas, exercendo um controle diferente conforme os conteúdos tratados, com o objetivo de que no final os alunos possam aplicar e utilizar de maneira autônoma os conhecimentos que adquiriram.

Será necessário oportunizar situações em que os meninos e meninas participem cada vez mais intensamente na resolução das atividades e no processo de elaboração pessoal, em vez de se limitar a copiar e reproduzir automaticamente as instruções ou explicações dos professores. Numa primeira fase, os alunos seguirão os modelos ou as diferentes ações propostas pelos professores, com uma ajuda intensa por parte deste. Nas fases seguintes será retirada esta ajuda de maneira progressiva, usando pouco a pouco os conteúdos que ainda são utilizados pelo professor ou professora e assegurando a passagem progressiva de competências do nível interpessoal inicial, quando todos trabalham juntos, para o nível intrapessoal, quer dizer, quando o aluno é capaz de utilizá-las de forma autônoma.

Isto supõe levar a cabo uma ação de observação do processo de cada aluno para retirar as ajudas e assegurar-se, assim, de que o aluno atua de forma autônoma não apenas na compreensão, no domínio ou na interiorização dos conteúdos, procedimentais ou atitudinais, como também na definição de objetivos, no planejamento das ações que lhe permitam alcançá-los e em sua realização e controle. Enfim, em tudo o que envolve ter adquirido estratégias metacognitivas que possibilitem a autodireção e a auto-regulação do processo de aprendizagem.

Haverá que promover o trabalho independente através de situações em que possam se atualizar e utilizar autonomamente os conhecimentos construídos, assegurando a atividade construtiva do aluno e sua autonomia, a fim de que possa aprender por si mesmo. Frente aos entraves que se apresentam ao aprender, é possível recorrer à ajuda externa. Mas só na medida em que os meninos e meninas sejam capazes de se dar conta dos próprios erros e de buscar os recursos necessários para superá-los, poderemos falar de aprender a aprender, o que quer dizer que para aprender a aprender eles também devem aprender a se dar conta do que sabem e do que não sabem e a saber o que podem fazer quando encontram um obstáculo. Será necessário ensinar-lhes que, quando aprendem, devem levar em conta o conteúdo de aprendizagem, assim como a maneira de se organizar e atuar para aprender.

Avaliá-los conforme suas possibilidades reais e incentivar a auto-avaliação de suas competências

Pudemos ver a importância da percepção que cada um tem de si mesmo para encontrar interesse na aprendizagem. Também vimos a necessidade de que os meninos e meninas sejam partícipes do próprio processo de aprendizagem, que sejam conscientes de como se desenvolveu. Do papel que tem para a aprendizagem a avaliação que os professores fazem de seus alunos e da necessidade de que as ajudas que ofereçam sejam adequadas a suas possibilidades reais, decorre que a função básica dos professores deve ser incentivar os alunos a realizar o esforço que lhes permita continuar progredindo. E isto só será possível quando a avaliação dos resultados que se transmite ao aluno for feita com relação a suas capacidades e ao esforço realizado. Este é provavelmente o único conhecimento que é preciso saber com justiça, já que é o que permite promover a autoestima e a motivação para continuar aprendendo.

Assim, pois, será preciso confiar, e demonstrar esta confiança, no esforço dos meninos e meninas, devolvendo-lhes a avaliação de seu próprio progresso, levando em conta a situação pessoal de partida, os obstáculos que tiveram que superar e os tipos de ajuda com que contaram, quer dizer, o conjunto de variáveis que intervêm em cada um dos trajetos realizados. Trata-se de reconhecer o trabalho bem feito, mas sobretudo o esforço realizado, fazendo-os ver as dificuldades que tiveram que solucionar e os meios de que dispuseram. Enfim, respeitar o fato diferencial é uma medida-chave para promover a atitude favorável para continuar aprendendo e para melhorar o conhecimento dos processos pessoais de aprendizagem. Com esta finalidade será necessário apresentar atividades de avaliação nas quais seja possível atribuir os êxitos e os fracassos da aprendizagem a motivos modificáveis e controláveis, como fórmula para entender que é possível avançar quando se realiza o trabalho e o esforço suficientes para consegui-lo.

E necessário que os alunos conheçam e se apropriem dos critérios e dos instrumentos que os professores utilizam para avaliá-los. Que possam conhecer desde o princípio o que se quer deles, que sentido tem este objetivo, de que meios de ajuda disporão, que pautas e instrumentos são utilizados para, conhecer suas aprendizagens e que critérios- avaliativos serão aplicados. Neste sentido, ganha uma importância crucial a integração de atividades que promovam a auto-avaliação dos alunos. E preciso recusar fórmulas em que o controle e a avaliação recaem exclusivamente nos professores, sobretudo em situações e momentos alheios aos processos individuais de aprendizagem. Por outro lado, as situações de atuação conjunta favorecem o processo de autonomia progressiva e, portanto, a aquisição progressiva de estratégias de controle e regulação da própria atividade, imprescindíveis para promover a capacidade de aprender a aprender.

A INFLUÊNCIA DOS TIPOS DE CONTEÚDOS NA ESTRUTURAÇÃO DAS INTERAÇÕES EDUCATIVAS NA AULA

Do conhecimento de como se produzem os processos de aprendizagem se deduz, como vimos, uma série de relações que os incentiva: Estas condições são generalizáveis, referem-se a qualquer aprendizagem, independentemente do tipo de conteúdo. No entanto, todas elas são especialmente adequadas para o ensino dos conteúdos de caráter conceituai. Por outro lado, também, neste caso as características dos diferentes conteúdos fazem com que o tipo de atuação do professorado, e as relações interativas que tenham que se promover, sejam de uma maneira ou de outra conforme os conteúdos sejam de um ou outro tipo. Portanto, haverá que matizar os critérios gerais descritos anteriormente ou acrescentar outros novos, conforme os conteúdos a serem trabalhados sejam de caráter procedimental ou atitudinal.

A condição ativa dos conteúdos procedimentais e o fato de que os meninos e meninas realizem a aprendizagem com estilos diferentes, mas sobretudo com ritmos diferentes, obriga a incluir, em primeiro lugar, atividades suficientes que permitam realizar as ações que comportam estes conferidos tantas vezes quantas for necessário e, em segundo lugar, formas organizativas que facilitem as ajudas adequadas às necessidades específicas de cada um dos alunos. A realização de ações deve ser precedida, em termos gerais, da observação de modelos indicados pelos professores, adequados às possibilidades reais de cada menino e menina. Assim, pois, é preciso oferecer modelos da maneira de realizar o procedimento ou a técnica, é preciso oferecer um apoio constante na realização de cada um dos passos e é preciso retirar progressivamente estas ajudas até que os alunos sejam capazes de atuar de forma autônoma.

Para poder oferecer esta ajuda e apoio segundo as características particulares de cada menino e menina, será necessário adotar, entre outras coisas, medidas organizativas e meios materiais que facilitem uma atenção o mais individualizada possível: grupos fixos e móveis ou flexíveis, trabalho em dupla ou individual, com propostas de atividades e disposição de materiais que permitam o trabalho progressivo e sistemático na exercitação indispensável para o domínio da estratégia, procedimento ou técnica.

A aprendizagem dos conteúdos atitudinais, no entanto, requer uma reflexão mais profunda a respeito das relações interativas que devem ser promovidas. Relações que neste caso estão determinadas tanto pelas características gerais destes conteúdos - dada a importância que tem seu componente afetivo -, como pelos traços próprios de cada um dos valores, atitudes e normas que se propõem.

O fato de que para a aprendizagem dos conteúdos atitudinais seja preciso articular ações formativas, nas quais estes conteúdos sejam "vividos" pelos alunos, obriga a integrar em aula não apenas tarefas concretas, como principalmente formas específicas de desenvolvê-las em um clima e em. relações adequadas entre professores e alunos e entre os próprios alunos. O ambiente geral, as avaliações que se faz e as relações que se estabelecem têm que traduzir os valores que se quer ensinar. Assim, por exemplo, se um dos valores que se quer transmitir é a solidariedade, não basta propor atividades de debate e reflexão sobre comportamento de cooperação em diferentes ambientes e espaços sociais, mas será necessário que na aula se viva num clima de solidariedade onde existam possibilidades de atuar segundo estes princípios. Uma observação, este clima será o resultado das imagens que os próprios professores transmitem.

Se lembramos alguns dos valores mais relevantes e algumas das atitudes que decorrem dos mesmos, nos daremos conta de que sua aceitação como conteúdos de aprendizagem obriga os professores e os alunos a adotarem certos papéis determinados. Se como exemplo tomamos qualquer dos valores de tolerância, justiça, cooperação, solidariedade, liberdade, respeito mútuo, responsabilidade, participação, diversidade - que todo mundo aceita que é preciso promover nas escolas e pensamos as implicações educacionais que têm, poderemos ver que tipo de relações deve se propor na aula. Em primeiro lugar, observamos que dificilmente pode se cultivar algum destes valores se os próprios professores não têm, defendem e demonstram atitudes de tolerância, justiça, cooperação, etc. Isto, que é uma condição indispensável, não substitui as atuações educativas adequadas para que o valor em questão seja progressivamente incorporado pelos alunos.

Querer que os alunos assumam como valores a tolerância com os demais e a aceitação da diversidade, suas opiniões, suas maneiras de ser e suas crenças exige a presença em aula de um clima em que se atue de acordo com estes princípios. E este clima deve se traduzir em atividades que impliquem comover, que não se limitem à simples realização de trabalhos mais ou menos acadêmicos, mas que proponham tarefas em que seja necessário aceitar a diferença: trabalho em grupos heterogêneos, visitas, passeios, atividades recreativas, etc. Requer-se um conjunto de atividades e situações em que se produzirão conflitos, em que se deverá levar em conta os demais e renunciar à imposição dos próprios pontos de vista. Atividades, enfim, que obriguem a manifestar o contraste entre os colegas como ponto de partida para analisar os próprios comportamentos e fazer as avaliações que permitam interiorizar os princípios da tolerância.

Estreitamente vinculado à tolerância, conseguir que o respeito mútuo seja assumido como princípio de atuação supõe um ambiente que possibilite o diálogo e a abertura aos demais, um clima de participação em que se avaliem as opiniões, em que seja. possível defender os diferentes pontos de vista, em que exista a possibilidade de debater o que cada um pensa, aceitando que há diversas perspectivas sobre um mesmo fato, e a conivência harmoniosa de opiniões discrepantes. Implica fazer com que os alunos vejam ao que conduz a falta de respeito e sobre que princípios se sustenta. Os debates, a expressão das ideias, os diálogos, o trabalho em equipe ou a convivência são instrumentos tão necessários como os que decorrem do clima institucional que existe, da maneira de resolver os conflitos que possam se produzir ao nível de equipe por parte dos professores, de como se relacionam entre eles e com outros profissionais e pais, etc.

Para que os alunos sejam cada vez mais cooperativos e solidários será necessário promover atividades que os obriguem a trabalhar em diferentes tipos de grupos, que proponham situações que requeiram compartilhar materiais, trabalhos e responsabilidades, que lhes permitam se ajudar entre eles e nas quais se avalie sua conduta em relação a seu grau de participação. Atividades em que as relações entre os colegas potencializem a colaboração em vez da competição. Vivência dos brinquedos em equipe e esportes, não com o objetivo-chave de submeter o outro, mas de compartilhar um tempo agradável em grupo. Também convém trabalhar a potencialidade do grupo cooperativo como ajuda a aprendizagem e como instrumento de apoio emocional e situar o trabalho conjunto num marco em que o êxito de um implique o êxito dos outros, renunciando á situação habitual na qual o êxito costuma apoiar-se no fracasso mais ou menos encoberto do companheiro/adversário.

Formar na liberdade supõe considerá-la como uma possibilidade de expressão e ação (exercício responsável ao direito à liberdade); portanto, será necessário poder viver sensações em que se tenha cada vez mais a possibilidade de exercê-la. Trata-se de criar um clima em que os meninos e meninas percebam que são levados em conta; em que haja espaços onde possam atuar sentindo que o fazem segundo seus próprios critérios. São atividades em que as relações pessoais e coletivas são entendidas como vínculos de reciprocidade que fomentam a elaboração de projetos pessoais adequados às próprias necessidades e interesses em complementaridade com os dos demais. Neste sentido, convém evitar situações enganosas em que se dá liberdade aos alunos para que decidam o que convém que decidam; em que não se deixa que se enganem. Com os limites necessários para assegurar sua formação pessoal, educar na liberdade supõe assumir alguns riscos: os que decorrem de ter que renunciar à regulação externa exaustiva das decisões e dos comportamentos dos alunos. Portanto, educar na liberdade é educar nos critérios que tornam possível seu exercício responsável e respeitoso em relação aos demais.

Conseguir que a responsabilidade seja considerada como um valor próprio e se atue de acordo com ela implica promover, progressivamente, o trabalho autônomo. Há que possibilitar que os alunos, desde pequenos, sintam que há confiança em suas capacidades para assumir responsabilidades, que são capazes de tomar decisões de forma autônoma, que vejam que suas valorações e opiniões contam. Por tudo isso, é necessário que na aula se compartilhem cada vez em maior grau a gestão da escola, as decisões cruciais na vida do grupo, na avaliação cie seu trabalho e seu progresso.

Para que a participação, entendida como o compromisso pessoal para com o coletivo, seja um fato, será necessário dar oportunidades de participação em todos os níveis. Oferecer oportunidades de tomada de decisões que afetem a todo o grupo-classe, deixar espaços onde nem tudo esteja regulado externamente ou sujeito a mecanismos de controle. A participação não envolve tanto "fazer sua parte" num projeto pensado e compartimentado desde fora, mas definir um projeto compartilhado e estabelecer o compromisso pessoal para a realização de objetivos comuns.

Enfim, a complexidade do trabalho das atitudes e dos valores na escola é determinada por diversos fatores. Um deles, muito importante, decorre da contradição que seguido se torna evidente entre o que se tem que trabalhar em aula e o que está presente em nível social, nos meios de comunicação, nos interesses dos grupos de pressão, nos outros sistemas onde os alunos vivem. O segundo é a consideração que estes conteúdos devem, necessariamente, impregnar as relações institucionais em seu conjunto. E, o terceiro, a dificuldade para achar "procedimentos" claramente estabelecidos para trabalhá-los, ao contrário do que acontece com outros conteúdos. Acrescentamos, também, desde o ponto de vista do docente: haver refletido sobre os valores, haver adotado pontos de vista e opções e ser beligerante quando necessário. Tudo isso coloca alguns desafios suficientemente importantes para os professores, que requerem respostas individuais e coletivas.

Conclusões

Para concluir este capítulo devemos dizer que os princípios da concepção construtivista do ensino e da aprendizagem escolar proporcionam alguns parâmetros que permitem orientar a ação didática e que, de maneira específica, ajudam a caracterizar as interações educativas que estruturam a vida de uma classe. O resultado da análise destes parâmetros apresenta um marco complexo. Ensinar é difícil e não dá para esperar que a explicação das variáveis que intervêm possa ser feita por um discurso simplista.

Agora, tampouco devemos perder de vista que, em grande parte, poder trabalhar desde este marco implica uma atitude construtivista - baseada no conhecimento e na reflexão -, que contribui para que nossas intervenções, talvez de forma intuitiva em grande parte, se ajustem às necessidades dos alunos que temos em frente, nos levem a incentivá-los, a ver seus aspectos positivos, a avaliá-los conforme seus esforços e a atuar como o apoio de que necessitam para seguir adiante. Esta atitude, que mobiliza diversos recursos, se concretiza de forma diferente conforme o trabalho que realizam se centra mais em conteúdos conceituais, procedimentais ou atitudinais. Que todos façam parte do que temos que ensinar na escola não se deduz tanto de uma exigência burocrática da administração educacional, mas da necessidade de educar de modo íntegro as pessoas. De nosso ponto de vista, esta reflexão, talvez mais ideológica, se articula com a reflexão anterior, talvez mais psicopedagógica, para estabelecer as bases de um ensino que possa ajudar os alunos a se formarem como pessoas no contexto da instituição escolar.

Antoni Zabala - A Prática Educativa


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