Urbano e rural
O termo urbano, do latim urbanus, remete ao conceito de cidade.
Seu oposto, rural, remete a campo. As cidades têm características bem
diferentes do campo: em geral, têm maior densidade populacional, maior oferta de serviços e infraestrutura mais desenvolvida, com presença de hospitais,
instituições de ensino, vias públicas, redes de transporte, opções de lazer, áreas
industriais, comerciais e residenciais. Já o campo é predominantemente domina
do por atividades agropecuárias, e em certos espaços há áreas de preservação
ambiental. Em comparação aos espaços urbanos, os rurais registram baixa
concentração de pessoas. Em algumas localidades, há menor oferta de serviços
essenciais e infraestrutura com certa limitação.
O campo sofreu intensas transformações nos últimos 50 anos.
Observa-se no espaço rural o aumento de atividades tanto agropecuárias quanto não
agrícolas, como processamento, distribuição e comércio de produtos agrope
cuários; mecanização da produção; certa preocupação com a biodiversidade
e sua valorização; desenvolvimento do setor terciário; e
intensificação de fluxos materiais e imateriais. Essas no
vas características se expandiram sobretudo em virtude
do crescimento do agronegócio.
À transformação do espaço geográfico devido ao
surgimento e crescimento das cidades, incluindo suas
estruturas e características típicas, damos o nome de
urbanização. Esse processo ocorreu e continua ocor
rendo de modo desigual. Há 2 500 anos, por exemplo,
Roma, atual capital da Itália, já contava com 1 milhão de
habitantes. Ainda na Europa, no século XIX, o processo de
industrialização levou milhares de pessoas a sair de áreas
rurais e ir para cidades em busca de oportunidades nas
indústrias, o que acabou elevando consideravelmente o
número de habitantes em cidades como Londres e Berlim.
O processo de urbanização
A urbanização é o processo no qual a população urbana cresce a taxas mais elevadas do que a população rural. Caracteriza-se pela tendên
cia de concentração da população de um país ou região nas cidades.
A urbanização mais acelerada aconteceu a partir das Revoluções In
dustriais, entre a segunda metade do século XVIII e o século XIX, em paí-
ses europeus, nos Estados Unidos e no Japão.
A industrialização atraiu
contingentes populacionais do campo para as cidades, em razão da ne
cessidade de mão de obra para as fábricas.
Em países como Brasil, México, Argentina e outros, a urbanização é mais
recente – intensificou-se a partir dos anos de 1950, com o crescimento da
atividade industrial. É importante lembrar, porém, que em alguns desses
países, como é o caso do Brasil, a urbanização não foi resultado apenas da
industrialização, mas também de problemas existentes no campo, como a
concentração fundiária, o difícil acesso à propriedade da terra e outros. A mecanização e a introdução de inovações científicas e tecnológicas em atividades agropecuárias também
têm relações com a urbanização nos últimos 50 anos.
Embora tardio em comparação às potências europeias, o processo de urbanização no Brasil foi significativamente acelerado e transformou completamente
a configuração do país. Fatores como a Proclamação
da República, o fim da escravidão e o desenvolvimento industrial – este impulsionado especialmente pelo
café – pressionaram e aceleraram a urbanização de
cidades brasileiras.
A partir dos anos 1970, com a modernização da
agricultura e a expansão das atividades industriais no
Brasil, a população das cidades superou a do campo
e o país se tornou, de fato, urbano.
A evolução da população urbana brasileira
entre 1960 e 2015.
Recife, São Paulo e Rio de Janeiro foram algumas
das primeiras cidades a receber saneamento básico e
aparelhos de infraestrutura urbana. Na cidade de São
Paulo, por exemplo, foi demolida grande parte do an
tigo centro, cujo projeto paisagístico lembrava o das
ruas de Paris. Entre as décadas de 1950 e 1970, a
cidade foi reurbanizada por meio da verticalização das
construções e da abertura de grandes vias, além do
alargamento da Avenida Rio Branco e da Avenida São João.
O processo de urbanização no Brasil, principalmente começando na década
de 1950 e se estendendo pelas décadas seguintes, está vinculado à expansão e
à modernização das atividades industriais – sobretudo nas cidades das regiões
Sudeste e Sul – e à modernização da agricultura. Em virtude dessas moderni
zações e do crescimento econômico acentuado, houve expressivo êxodo rural
e intensa migração interna entre regiões, com destaque para o fluxo da Região
Nordeste para o Sudeste. Além disso, ocorreram mudanças na paisagem natural
dessas cidades, entre as quais pode-se destacar a redução de áreas florestais, a
retificação dos rios e o aumento da poluição atmosférica e hídrica.
O crescimento da população urbana
Até o início do século XIX, a população urbana mundial não havia atin
gido 7% do total. Cerca de dois séculos depois, em 2008, pela primeira vez
na história, a população urbana ultrapassou os 50% (cerca de 3,3 bilhões de
pessoas). Segundo previsões da ONU, esse número chegará a 5,2 bilhões
em 2030, representando 60,4% da população mundial.
Estima-se que, nas próximas décadas, o crescimento urbano nos paí
ses desenvolvidos não será muito elevado (cerca de 13%); entretanto, du
plicará principalmente em países da Ásia e da África em cerca de 15 anos.
Diante disso, uma parcela cada vez maior da população mundial estará
exposta à pobreza, ao desemprego e aos riscos ambientais associados à
urbanização acelerada, como a deficiência de saneamento básico.
Segundo a ONU, aproximadamente 30% da população urbana mun
dial vive em condições de pobreza, cerca de 1,2 bilhão de pessoas
moram em áreas irregulares e habitações precárias e entre 20 e 40 mi
lhões de famílias não têm moradia. A falta de emprego é outro grave
problema, levando 50% dos moradores de áreas urbanas a trabalhar na
informalidade. Além disso, se confirmada a previsão de que, até 2050,
a população urbana será de 6,7 bilhões, a pobreza nas cidades deverá
se agravar caso não sejam tomadas providências para erradicá-la.
Os problemas associados à urbanização serão mais graves nas
megacidades e nas megalópoles (consulte o mapa). Em 1950, Nova York
e Tóquio eram as duas megacidades do planeta; em 2007, havia dezeno
ve; e, em 2022, o número de megacidades passou a ser de 32, a maioria
concentrada nos países menos desenvolvidos, onde os problemas eco
nômicos, sociais e ambientais são graves (desemprego, violência, carên
cia de transporte público, poluição, saneamento básico deficiente etc.).
Nas próximas décadas, as megacidades se concentrarão nos países emergentes e nos menos desenvolvidos, enquanto o crescimento desse tipo de
aglomeração urbana nos países desenvolvidos tenderá à estabilização.
Cidades e hábitos de consumo mundializados
Para 2022, estimava-se que haveria mais de 570 cidades no mundo
com mais de um milhão de habitantes; em 1950 elas eram apenas 86. Nas
últimas décadas, o aumento de pessoas nas cidades tem impulsionado o
consumo de produtos diversos, desde aqueles essenciais à sobrevivência,
como os alimentos, até os mais supérfluos. Como nessas aglomerações
não há espaço para a produção de alimentos em larga escala, as pessoas
são obrigadas a adquiri-los em feiras e supermercados ou em outros pon
tos de abastecimento. Além disso, o estilo de vida nas grandes cidades
demanda o uso de produtos específicos para as pessoas trabalharem,
se locomoverem, se comunicarem, entre outras necessidades.
Como estudamos nos Percursos 2 e 3, os modelos de consumo das
grandes cidades são difundidos mundialmente e, em geral, seguidos
por grande parte da população. Assim, as empresas transnacionais têm
expandido seus negócios e investido muito em propaganda, o que
influencia na mundialização de alguns hábitos e na implantação da
globalização cultural.
Transformações da produção
agropecuária e urbanização
As transformações da atividade agropecuária, decor
rentes da introdução de inovações científicas e tecnológicas no campo, desde os anos 1960, ajudam a explicar
não somente a intensa urbanização após esse período,
como também o desemprego estrutural no campo.
A intensificação do uso de máquinas agrícolas, fer
tilizantes, agrotóxicos e rações, além do melhoramen
to genético de plantas e animais, alterou o rendimento
e a produtividade da agropecuária.
Já em 1960, as sementes híbridas de cereais, obtidas
em laboratórios de pesquisas, possibilitaram maior rendi-
mento das lavouras e maior resistência a pragas e doen
ças, o que ficou conhecido como Revolução Verde.
Nos anos 1980, organismos geneticamente modificados (OGMs) começaram a ser
desenvolvidos a partir de sementes transgênicas, representando outra inovação cientí
fica e tecnológica importante para as transformações na agropecuária.
Os cultivos com sementes de alto rendimento da Revolução Verde, como também
os OGMs, exigem aplicação de defensivos agrícolas, fertilizantes etc. Entretanto, o uso
intensivo de agrotóxicos é responsável por grandes danos ambientais: ao solo, pois
este os retém, comprometendo a sua biodiversidade; ao ar, pois o material em suspen
são provoca danos à saúde humana e a outros seres vivos, além da contaminação de
alimentos; às águas superficiais e subterrâneas, além de outros.
Nos anos 1990, com o desenvolvimento da informática, muitas de suas inovações
foram empregadas na agropecuária: aplicativos para o gerenciamento dessa ativida
de; drones para detectar doenças e pragas em plantações e pastagens, falhas de plan
tio, contagem do número de cabeças de gado, localização de nascentes de águas etc.;
além de máquinas agrícolas computadorizadas.
Se, por um lado, as inovações científicas e tecnológicas favoreceram a agropecuária
por meio do aumento do rendimento e da produtividade, por outro, substituíram parte da mão de obra empregada no campo e provocaram o desemprego estrutural. Dispensadas do trabalho no campo, populações migraram para as cidades, contribuindo
para o processo de urbanização.
A urbanização nos séculos XX e XXI
A urbanização intensificou-se a partir de 1950, principalmente em decorrência do crescimento populacional mundial, da industrialização em
vários países – fato que atraiu populações do campo para as cidades em
busca de emprego – e também em virtude de vários problemas nas zonas
rurais que provocaram êxodos para as cidades.
Entretanto, com o crescimento populacional, problemas que afetam
diretamente a qualidade de vida das pessoas se agravaram: destinação
inadequada do lixo, congestionamento do tráfego de veículos, falta de
emprego, transporte público precário e sobrecarregado, poluição atmosférica e hídrica em rios que banham as cidades, redes de abastecimento
de água e de esgoto insuficientes, pequena quantidade de escolas e hospitais para atender a população etc.
A urbanização acelerada provocou também a ocupação desordenada no espaço urbano, por exemplo, com a localização de indústrias causadoras da poluição ambiental, incluindo sonora, ao lado de residências.
Outro resultado grave foi a formação de bairros sem infraestrutura urbana
necessária – redes de água e de esgoto, energia elétrica, pavimentação
de ruas, coleta de lixo, escolas etc. –, além da expansão de moradias precárias em favelas, principalmente em países em que grande parte da
população vive em condição de pobreza – no Brasil, em 2021, mais de
17 milhões de pessoas viviam em favelas.
▪ As moradias precárias
Embora um grande número de pessoas no mundo viva em moradias
precárias, ninguém gosta de morar em habitações sem conforto e higiene, sem redes de abastecimento de água e esgoto, sem espaço suficiente
para dormir, cozinhar, fazer refeições, tomar banho, reunir-se etc.
É importante compreender as moradias precárias como forma de
sobrevivência social, ou seja, não tendo onde morar em condições dignas ou apropriadas, a população de baixa renda constrói moradias em
espaços fragilizados ou de risco – encostas de morros, margens de rios e
córregos –, em terrenos baldios (terreno não aproveitado) e até mesmo
sob viadutos e pontes.
Compreendemos, assim, que há razões sociais, econômicas e políticas que levam o ser humano a morar nessas condições. Entre as razões
políticas está a falta de investimento suficiente do poder público – os
governos – no desenvolvimento de ações de prevenção e de medidas
para retirar essa população da situação em que se encontra.
▪ A organização do espaço urbano
Para ordenar a ocupação e o uso do espaço urbano por residências,
estabelecimentos comerciais, indústrias, escritórios, parques públicos
etc., os poderes Executivo e Legislativo do município, geralmente com
participação de seus moradores, têm procurado criar um conjunto de
princípios e regras que orientam a ação humana no espaço da cidade.
No Brasil, esses princípios e leis recebem o nome de Plano Diretor,
cuja elaboração está prevista na Constituição
Federal de 1988 e no Estatuto da Cidade (Lei
no 10257/2001). É fundamental que haja a participação da população ao longo das etapas de
elaboração do Plano Diretor, cujo objetivo é
orientar as ações do poder público a fim de promover a ordenação dos espaços do município,
a urbanização e a sustentabilidade, garantindo
o direito à cidade e à cidadania de forma mais
justa e a qualidade de vida à população local,
tornando possível o desenvolvimento das funções sociais urbanas em sua plenitude, bem
como de cada propriedade em particular.
Aterramento marítimo
Em algumas cidades do mundo, em virtude de limitações impostas
pelo meio físico – relevo montanhoso, rede hidrográfica e solo –, para a
cidade crescer e ganhar espaço para acomodar suas construções, entre
elas indústrias, vias de tráfego, parques públicos etc., as administrações
das cidades – prefeituras, no caso do Brasil – usam técnicas de engenharia que possibilitam ocupar terras inundadas por pântanos ou mares.
Isso ocorre principalmente naquelas muito povoadas, localizadas junto
ao mar e com restrições de território para se expandir, construindo-se
o aterramento marítimo ou aterro marítimo.
Trata-se de um processo de depositar areia ou terra em áreas ocupadas pela água do mar, com uso de tecnologia, transformando-as em
terras emersas para a agropecuária e para construções residenciais,
comerciais, industriais e, até mesmo, para aeroportos, como é o caso do
Aeroporto Haneda, no Japão.
O recurso do aterro marítimo para ampliar o espaço urbano e as áreas
de agricultura tornou-se uma prática realizada por vários países, incluindo o Brasil. Ele foi implantado nos Países Baixos, Emirados Árabes,
Coreia do Sul, Cingapura, Nova Zelândia, China, Estados Unidos e outros.
No Brasil, destaca-se o Aterro do Flamengo, na cidade do Rio de Janeiro, que permitiu ampliar consideravelmente a faixa de terra litorânea,
facilitando a implantação de vias de circulação de veículos e dificultando a invasão das águas do mar por ocasião das ressacas. É nesse aterro
que se situa o Parque do Flamengo, importante área de lazer ao ar livre.
Problemas urbanos
Em maior ou menor intensidade, as cidades brasileiras, como também as de muitos outros países, enfrentam vários problemas. Entre eles,
os de saneamento básico, violência, condições precárias de moradia,
má qualidade dos transportes urbanos, congestionamentos de trânsito,
poluição atmosférica, sonora, dos rios e de aquíferos, serviços públicos
deficientes – limpeza urbana, conservação de vias públicas, falta de escolas e hospitais –, além de outros.
Todos esses problemas precisam ser resolvidos, pois comprometem
a qualidade de vida dos moradores e geram inseguranças, como é o
caso, principalmente, da violência urbana.
Quanto ao saneamento básico ou ambiental, está estritamente relacionado à saúde da população. A sua falta ou cobertura incompleta é
responsável pela ocorrência de várias doenças: febre tifoide, cólera, leptospirose, disenteria bacteriana etc.
Urbanização e capital financeiro
O recente processo de urbanização se confunde com a história da industrialização e
da formação do capital financeiro – o capital representado por títulos e papéis negociá
veis que podem ser convertidos em dinheiro. Os bancos ou instituições financeiras, fru
tos do desenvolvimento do capitalismo, tiveram e têm função importante na produção
e na circulação de mercadorias em todo o mundo.
Essas empresas passaram a financiar as atividades produtivas e o consumo. Hoje,
o capital financeiro está presente em quase todas as transações comerciais – a maioria
das empresas e das pessoas dependem de empréstimos para adquirir imóveis, máqui
nas, matérias-primas etc.
As cidades globais
As metrópoles que sediam as bolsas de valores mais importantes do mundo tam
bém concentram as sedes administrativas ou filiais das grandes multinacionais, os maio
res bancos e instituições financeiras, entre outros. Assim, elas funcionam como centros
para onde converge e propaga-se a maior parte dos fluxos gerados pela globalização
e, por isso, são chamadas cidades globais ou metrópoles mundiais.
Daí se explica a concentração espacial da atividade financeira em grandes cidades como Nova York, Londres, Paris, São Paulo, entre outras, o que, contemporaneamente, permitiu a formação das chamadas cidades globais.
As cidades globais configuram-se como centros de poder e comando das decisões econômicas e financeiras mundiais. Também formam os polos de uma rede
mundial, que se articulam por meio de uma infraestrutura que possibilita a circulação
dos fluxos da globalização. Desse modo, o espaço geográfico das cidades globais
destaca-se por abrigar:
• os mais altos e modernos edifícios, nos quais se encontram as sedes das maiores
corporações empresariais, dos grandes bancos, das bolsas de valores e das com
panhias financeiras, que movimentam os fluxos de capitais;
• as grandes redes de telecomunicações (emissoras de televisão e rádio, agências
de notícias e empresas de telefonia e provedores de internet), que possibilita a
circulação dos fluxos de informações;
• as melhores infraestruturas de transportes (rede rodoviária, ferroviária e aero
portuária), pelas quais circulam os fluxos de pessoas e de mercadorias.
As cidades globais se destacam pela importância econômica e por concentrarem atividades e infraestruturas indispensáveis na economia globalizada: bolsas de valores, aeroportos internacionais, amplos serviços de hotelaria, grandes centros de eventos, extensas redes de telecomunicação, muitos hospitais, diversos equipamentos culturais etc.
Embora algumas cidades globais também estejam localizadas em países subdesenvolvidos, devemos ressaltar que a distribuição dos fluxos é bastante desigual entre
países ricos e pobres.
As megacidades
As megacidades são metrópoles muito populosas, com mais de 10 milhões de
habitantes, comuns, sobretudo, em países menos desenvolvidos. Essas megacidades
resultaram de um intenso e rápido processo de urbanização, cuja infraestrutura, muitas vezes, é insuficiente para atender às necessidades da população. De modo geral,
as megacidades exercem um papel secundário na economia mundial e na articulação
dos fluxos globais devido à sua menor importância financeira, comercial, política etc.