Sul: ocupação, economia e urbanização
Curitiba, capital do estado do Paraná, é uma importante metrópole da Região Sul. Ao lado de Florianópolis (SC) e Porto Alegre (RS), as outras duas capitais estaduais da região, a capital paranaense tem grande relevância econômica e cultural nos âmbitos regional e nacional. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Região Sul respondeu em 2019 por 17% de todo o PIB brasileiro, perdendo apenas para o Sudeste.
Ocupação e fluxos migratórios
Originalmente, as terras que hoje formam a Região Sul eram ocupadas por povos indígenas, como os charruas, os kaingangs e os guaranis, sendo estes últimos considerados os primeiros agricultores dessa porção do continente. Parte dessas terras foi, séculos atrás, controla da pela Espanha. Com a assinatura do Tratado de Madri, em 1750, os limites fronteiriços en tre as áreas pertencentes à Coroa espanhola e à Coroa portuguesa foram, então, redefini dos. Assim, o Sul passou a ser governado pelos portugueses, que, objetivando ocupar e domi nar todo o território, estimularam a imigração para essas áreas.
Assim, em meados do século XVIII, houve a primeira política migratória no país, já que Portugal incentivou sobretudo a vinda de famí lias paulistas e de casais açorianos (portugue ses do Arquipélago dos Açores) para ocupar a zona litorânea da região. Para tanto, a Coroa cedia terras, dinheiro, moradia, ferramentas e animais para ser usados no trabalho da lavoura.
Ainda no século XVIII, a mineração em Minas Gerais ajudou no cresci
mento das terras que hoje formam a Região Sul, já que algumas de suas
áreas se especializaram na pecuária para abastecer as áreas mineiras pro
dutoras de ouro e diamantes, que careciam de gêneros alimentícios para a
subsistência da população. Assim, nas estâncias (fazendas) do Rio Grande
do Sul, criava-se gado para a produção de charque, que era vendido para
a população mineira, a qual crescia a cada ano. Esse produto era transpor
tado por tropas de mulas que levavam a carga ao lombo. Como a distância
era grande, estabeleceram-se pousos para os tropeiros ao longo do tra
jeto. Muitos desses locais se transformaram, posteriormente, em cidades
importantes dessa região brasileira, como Erechim (RS), Lages (SC) e Ponta
Grossa (PR).
Imigração e centros urbanos sulistas
Até a segunda metade do século XIX, a ocupação da Região Sul estava basi
camente limitada às áreas litorânea e de planalto próximas à costa. Essa rea
lidade mudou com a chegada de grandes levas de imigrantes europeus. Eram
famílias de várias nacionalidades, sobretudo alemãs, italianas, polonesas, ucra
nianas e espanholas, que se instalaram principalmente em colônias, ou seja, lo
calidades compostas de pequenas e médias propriedades rurais, cuja produção
agrícola era baseada, sobretudo, na policultura e na criação de aves e de gado
leiteiro. Algumas dessas colônias de imigrantes deram origem a importantes
centros urbanos da atualidade, como as cidades de Novo Hamburgo e Caxias
do Sul (RS) e Blumenau e Joinville (SC).
Mais tarde, já no início do século XX, com a expansão das plantações
de café, houve uma nova “onda migratória” do interior de São Paulo em
direção ao norte do Paraná. Além dos imigrantes paulistas, essa área re
cebeu mineiros, nordestinos, descendentes de europeus e muitos japo
neses. Com esse processo de
ocupação e a riqueza econô
mica gerada pela produção de
café, foram fundados importan
tes centros urbanos, como as
cidades de Londrina e Maringá
(PR). Isso tornou a ocupação da
região mais homogênea, ainda
que existissem áreas pouco po
voadas, como o oeste de Santa
Catarina e o oeste e sudoeste do
Paraná.
Deslocamentos internos e emigração
A partir de 1950, a modernização conservadora da agricultura, ou seja, o
processo baseado na expansão do latifúndio, da monocultura e da mecanização
do campo, provocou um grande deslocamento populacional dentro da própria
Região Sul. Muitas famílias, sobretudo gaúchas, migraram em busca de ter
ras mais baratas no oeste de Santa Catarina e no sudoeste e oeste do
Paraná, fazendo com que a atividade madeireira e a agricultura se
destacassem nessas áreas, o que provocou o desenvolvimento
de núcleos urbanos, como Chapecó (SC) e Cascavel (PR).
Contudo, a abertura dessas novas áreas de ocupação não
foi suficiente para a fixação da população, o que provocou
ondas de emigração, ou seja, a saída de sulistas para ou
tras regiões brasileiras. Assim, entre as décadas de 1960 e
1990, grande quantidade de catarinenses, gaúchos e para
naenses deslocaram-se em busca de novas terras, princi
palmente no interior de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,
Goiás e Rondônia, chegando a fixarem-se também em países
vizinhos, como o Paraguai e a Bolívia. Destacam-se nesse mo
vimento emigratório os deslocamentos provenientes do norte
do Paraná e do Rio Grande do Sul, talvez o mais expressivo de
todos. Segundo o IBGE, no ano de 2010, aproximadamente 2 mi
lhões de gaúchos e paranaenses viviam fora de seu estado de origem.
Agropecuária sulista
O processo de ocupação da Região Sul esteve
ligado ao desenvolvimento de atividades agropecuárias, baseadas sobretudo
na mão de obra familiar, com exceção da pecuária extensiva em grandes pro
priedades rurais no Rio Grande do Sul. Contudo, durante a segunda metade
do século XX, essa realidade começou a mudar com a expansão da chamada
agropecuária comercial. Vamos entender como se desenvolvem na atualidade
essas duas modalidades agrícolas na Região Sul.
Agricultura familiar
A produção rural desenvolvida em pequenas e médias propriedades (chácaras e sítios) e com base na mão de obra familiar, em que trabalham quase ex
clusivamente apenas famílias de camponeses, é um aspecto marcante da paisa
gem da Região Sul do Brasil. De acordo com dados do IBGE (2018), cerca de 600
mil famílias se encontram envolvidas com a modalidade da agricultura familiar
nos três estados sulistas. Nessas propriedades rurais, prioriza-se a produção de
gêneros alimentícios, como arroz, feijão, milho, mandioca, ovos e leite, e de
produtos artesanais, como queijos, farinhas, doces e embutidos.
A partir da década de 1970, verificou-se um
processo de modernização de boa parte das pro
priedades familiares nessa região, com a introdu
ção do chamado sistema integrado de produção.
Esse sistema consiste na parceria entre os peque
nos e médios proprietários rurais e as chamadas
agroindústrias, como frigoríficos, laticínios, vi
nícolas e outros tipos de indústrias alimentícias.
Estas cedem insumos agrícolas, como sementes,
filhotes de aves e assistência técnica (agrônomos
e veterinários) aos agricultores familiares, os quais
se comprometem em comercializar sua produção
exclusivamente com essas empresas.
Agricultura comercial moderna
O espaço rural da Região Sul passou por profundas transformações a partir da década de 1970. Ao lado da modernização de parte das pe
quenas e médias propriedades rurais, houve também um intenso processo de
concentração de terras (aumento do número de grandes propriedades rurais),
de mecanização das lavouras e do cultivo de produtos voltados à exportação, as
chamadas commodities.
Dessa forma, a área de produção do trigo, do milho, do café e principalmen
te da soja foi ampliada na região, resultando, nas décadas seguintes, na expulsão de muitos trabalhadores rurais, obrigados a se deslocar para os centros
urbanos próximos – e outras regiões distantes, como vimos na página 157.
Atualmente, a agricultura comercial moderna é praticada em grandes
propriedades e com alta tecnologia (uso de sementes selecionadas, tratores,
colheitadeiras etc.). Destacam-se a produção de soja, cana-de-açúcar, algodão
e trigo no estado do Paraná; arroz, soja e trigo no Rio Grande do Sul; e arroz e
soja em Santa Catarina.
Segundo o IBGE, em 2020 o Paraná colheu sozinho, por meio dessa modalidade, aproximadamente 20 milhões de
toneladas de soja em grãos e 35 milhões de
toneladas de cana-de-açúcar. No caso do
trigo, destacaram-se o Rio Grande do Sul e
o Paraná, que são os principais produtores
desse grão no país.
Além da produção de grãos, destaca-se a
monocultura de eucalipto e pínus (silvicultura), que tem avançado em todo o território
brasileiro. Na Região Sul, cuja área planta
da é de 35% do total nacional, o estado com
maior área plantada – a segunda do Brasil –
é o Paraná, 1 milhão e meio de hectares, do
qual cerca de 53% são de pínus.
Impactos socioambientais no espaço rural
É possível afirmar que o processo de modernização das atividades agrícolas
aumentou a produtividade das lavouras e das criações, gerando riquezas mo
netárias para a Região Sul e para o Brasil. Por outro lado, é importante enten
dermos que a agricultura e a pecuária comercial moderna também têm causa
do graves impactos ecológicos e sociais, que derivam de suas práticas.
Entre esses impactos estão: a contaminação do solo e da água decorrente
do uso excessivo de fertilizantes e agrotóxicos, o aumento do desmatamento
das vegetações nativas e, consequentemente, a diminuição da biodiversidade e
o aumento da erosão e da perda de fertilidade natural dos solos.
Do ponto de vista social, verificam-se alguns impactos negativos, como a
concentração de terras e a expulsão de milhares de famílias camponesas. Na
maioria das vezes, estas acabam tendo de atuar como trabalhadores rurais
volantes ou migrar para as áreas urbanas da região ou para outras partes do
país em busca de melhores condições de vida. Além disso, nas últimas décadas
cresceu grandemente a dependência do produtor rural em relação às grandes
empresas do setor, que exercem controle sobre a distribuição de sementes e
de outros itens da produção agropecuária.
Impactos causados por hidrelétricas
Além da concentração de terras, outro fato que tem expulsado centenas
de famílias sulistas de suas propriedades rurais é a construção de barragens de
usinas hidrelétricas, pois elas inundam centenas de quilômetros quadrados de
terras a fim de formar seus lagos artificiais. Calcula-se que, nas últimas décadas,
milhares de famílias tiveram de deixar suas terras em razão da construção de
hidrelétricas no Sul do Brasil, e boa parte delas, até hoje, não recebeu a devida
indenização pela perda das propriedades.
O relevo da Região Sul é composto de extensas
áreas de planaltos, com terrenos acidentados e
muitas serras (veja o mapa ao lado). Essa caracte
rística proporciona elevado potencial para a explração de energia hidrelétrica, sobretudo, por meio
da construção de barragens em rios de planalto,
que cortam os vales bem encaixados à região.
É o que ocorre nos vales tanto dos rios Paraná e
Iguaçu, no Paraná, como nos rios Uruguai e Pelo
tas, na divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa
Catarina. Calcula-se que o Sul gere aproximada
mente 25% de toda a energia elétrica consumida
no Brasil. Por outro lado, os lagos formados pelas
barragens dessas hidrelétricas cobriram milhares
de hectares de terras produtivas.
Urbanização e indústria
A origem de várias cidades da Região Sul está relacio
nada aos fluxos migratórios e ao desenvolvimento de atividades econômicas
ligadas à agropecuária. Até os anos 1970, o processo de urbanização sulista foi
bastante vagaroso, com exceção das capitais Porto Alegre (RS) e Curitiba (PR).
De maneira geral, enquanto o Sudeste apresentava, naquela década, uma urba
nização mais acelerada, já com taxas acima de 70%, no Sul elas encontravam-se
em torno de 40%.
Na década de 1990, a taxa de urbanização dessa região chegou a 74% e, em
2010, atingiu 85%. Esse salto no processo de urbanização sulista é decorrente
do intenso êxodo rural ocorrido no período, quando milhares de famílias que
viviam no campo se dirigiram às cidades, devido, como vimos, à modernização
das lavouras, à concentração de terras ou à desapropriação para construção de
barragens de usinas hidrelétricas.
Além desses aspectos, deve-se ressaltar que, nesse mesmo período, a re
gião passou por um acelerado desenvolvimento industrial e uma ampliação de
seu sistema de transportes (rodovias, portos e aeroportos) e de comunicações,
o que atraiu ainda mais pessoas para os centros urbanos.
Atualmente, o parque industrial sulista é o segundo maior do Brasil – perde
apenas para o Sudeste –, apresentando grande abrangência de setores.
Densa rede de cidades
Porto Alegre e Curitiba são as principais metrópoles do Sul e exercem grande
influência sobre outros centros urbanos. Ao analisarmos a rede urbana da re
gião, verificamos que Curitiba, por exemplo, influencia cidades como Londrina,
Ponta Grossa e Cascavel, no Paraná. Porém, essa ação ultrapassa os limites do
estado, atingindo Florianópolis, Blumenau e Chapecó, em Santa Catarina. Por
sua vez, Porto Alegre influencia todas as cidades do Rio Grande do Sul. Além das
duas metrópoles regionais, outras cidades se destacam na rede urbana sulista.
Clima subtropical e biomas sulinos
O clima tropical típico atua somente na parte norte do estado do Paraná. No restante do Sul, que
é a maior parte, atua o clima subtropical, caracterizado por boa distribuição de
chuvas durante o ano e por médias térmicas anuais inferiores às das demais
regiões brasileiras.
Sobretudo no inverno, as tem
peraturas são bem baixas em
comparação com outros lugares
do Brasil. Isso ocorre em razão da
influência da massa polar atlântica
(mPa), uma massa fria que ocasiona
geadas e até neve nas áreas de pla
nalto com maiores altitudes. Essa
massa de ar é responsável tam
bém pela geração de minuano, um
vento frio que adentra a Região Sul
no outono e no inverno, atuando
predominantemente no Rio Grande
do Sul. Durante o verão, as tempe
raturas aumentam, já que há a pre
dominância de atuação da massa
tropical atlântica (mTa) e da massa
tropical continental (mTc).
Biomas sulinos
As características climáticas e suas inter-relações com outros aspectos natu
rais, como o relevo e a hidrografia, criam as condições necessárias à existência
dos seguintes biomas na Região Sul: a Mata de Araucárias, a Mata
Atlântica, a Vegetação Litorânea e os Pampas ou Campos
Sulinos. Observe a distribuição espacial desses biomas
pela região no mapa ao lado. Em seguida, vamos conhe
cer as características de cada um deles.
Mata de Araucárias
A Mata de Araucárias, também denominada Mata de
Pinhais, ocorre em conjunto com áreas do bioma da Mata
Atlântica. Essa formação vegetal desenvolve-se, princi
palmente, nas regiões de planaltos de maiores altitudes
(como na fotografia da página 166), onde as temperaturas
são mais baixas, desde o sul do estado de São Paulo, até o
norte do Rio Grande do Sul. Entre as espécies predominan
tes destaca-se a Araucaria angustifolia, um pinheiro (conífera) com folhas pontiagudas. São árvores de grande porte,
que podem chegar a mais de 30 metros de altura. Entre
tanto, na mata, verifica-se a presença de outras espécies, como o cedro, a canela,
jacarandá e a guabiroba. A Mata de Araucárias foi intensamente degradada des
de a ocupação inicial da Região Sul, tanto pelo desmatamento para a implantação
de projetos agropecuários – como o plantio de erva-mate e a criação de gado – quanto pela exploração da madeira para a produção de móveis, por exemplo.
Mata Atlântica e Vegetação Litorânea
Na Região Sul, bem como em outros locais do territó
rio brasileiro, a Mata Atlântica predomina nas áreas de
clima mais quente e com maior frequência de chuvas.
Esse bioma tem aspecto muito exuberante
nas regiões mais próximas ao litoral, como
na Serra do Mar, no Paraná e em Santa
Catarina, assim como em partes do interior
dos três estados sulinos.
A Mata Atlântica encontra-se bastante
degradada na Região Sul, devido à explora
ção das áreas ocupadas na época colonial, e à implantação das monoculturas – como a do
café, no norte do Paraná – na primeira me
tade do século XX.
Além das atividades agrícolas, os proces
sos de urbanização e industrialização con
tribuíram para acelerar essa degradação do
bioma, reduzindo drasticamente sua área.
Pampas
O bioma de Pampas, também chamado de Campos Sulinos, ocupa quase a
metade do território do estado do Rio Grande do Sul, além de partes do ter
ritório dos países vizinhos Uruguai e Argentina. É um bioma
caracterizado pela presença de gramíneas e vegetação arbus
tiva bem esparsa. O solo é considerado fértil, porém bastante
arenoso, muito propenso à erosão.
Desde o Período Colonial, há cerca de 300 anos, os Campos Sulinos são utilizadoscomo pastagens naturais para a criação de gado bovino e
ovino. Além da atividade pecuária, mais recentemente, nas
últimas décadas, os Pampas também têm sido ocupados
pelas lavouras de grãos, em especial de soja. Esse processo
de exploração trouxe a essa região sul-rio-grandense gra
ves impactos ambientais, como o fenômeno de arenização
dos solos.
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