O desenvolvimento industrial ocorrido a partir do século XVIII não ficou restrito apenas às
cidades, onde as indústrias surgiram e se expandiram. Também provocou importantes alterações
nos modos de produzir e de trabalhar no campo.
Com o desenvolvimento técnico e científico, foram ocorrendo inovações nas atividades
agropecuárias, como a mecanização da produção e o uso de substâncias como fertilizantes e
agrotóxicos.
Ao mesmo tempo que essas inovações resultaram em aumento da produtividade, elas
reduziram a necessidade da mão de obra e, aliadas à concentração de terras, ajudam a explicar
o intenso êxodo rural em diversos países.
Atualmente, um pouco mais da metade da população mundial vive em cidades e estimativas
indicam que, até a metade do século XXI, esse percentual será de cerca de 70%.
A demanda por alimentos e matérias-primas é grande e crescente, atraindo o interesse de
empresas e governos dos países desenvolvidos por terras agricultáveis.
Além de a agropecuária reunir atividades de cultivo e criação de animais voltadas à produção de alimentos e de matérias-primas, ela tam bém participa da produção de combustíveis e da geração de energia elétrica com o uso da biomassa.
Com o crescimento da população urbana no mundo, a agropecuária passou a ter uma importância ainda maior. Especialmente a partir da década de 1960, diante da acelerada urbanização também dos países de industrialização tar dia, houve a necessidade de produzir mais alimentos para atender ao crescente número de habitantes das cidades.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), em 2015, 31% da população ativa mundial trabalhava em
atividades agrícolas.
Segundo a mesma entidade, cerca de um
terço das terras emersas do planeta (continentes)
é de terra agrícola, onde se praticam a agricul
tura e a pecuária, um terço delas está coberto
com florestas e outras formações vegetais e um
terço é área de desertos, geleiras, altas monta
nhas ou está ocupado por cidades e outras infraestruturas. Mas isso varia de um continente
para outro, como mostra o gráfico ao lado. Ob
serve que a Ásia é o continente cujo território
tem o maior percentual de terras agrícolas e a
Europa, o menor.
É nesse contexto que se insere o aumento da capacidade de produção do setor agropecuário. Segundo dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), observa-se que a produção mundial de alimentos tem crescido constantemente nas últimas décadas, assim como o comércio internacional de produtos agropecuários. Recentemente, um relatório publicado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) indicou que, apenas entre 2000 e 2019, a exportação de produtos agrícolas apresentou aumento de 73%.
Produção agrícola no mundo
A maior parte da produção agropecuária está concentrada
em alguns países, com destaque para a China, os Estados Unidos e o Brasil.
A China produz excedentes exportáveis de algodão e chá, por exemplo.
Ao mesmo tempo, o país está entre os maiores importadores mundiais de
produtos agropecuários, com destaque para a soja e a carne bovina.
Os Estados Unidos se destacam como o maior exportador mundial de diversos produtos, sobretudo milho e soja, mas também são grandes importa
dores de alimentos que não cultivam por limitação climática, como algun s
produtos tropicais: banana, café e cacau, por exemplo.
O Brasil se destaca como grande exportador de produtos agrícolas como
soja, açúcar e café (maior produtor mundial) e produtos pecuários como carne
bovina e de frango. No entanto, a União Europeia é a região que mais se so
bressai no comércio mundial de produtos agropecuários, principalmente nas
trocas entre seus próprios membros.
Apropriação de terras e segurança alimentar
Nos últimos 20 anos, milhares de hectares de terras agricultáveis, principalmente nos países
pobres e em desenvolvimento, vêm sendo comprados ou alugados por grandes empresas,
muitas delas transnacionais, que reconhecem a agropecuária como uma
atividade econômica lucrativa e estratégica. Essas terras são usadas,
geralmente, para o cultivo de alimentos e de produtos voltados para a
exportação e as indústrias.
Nesse processo, os maiores prejudicados são os agricultores familiares
locais, que deixam de ter acesso à terra, agravando o quadro de insegurança alimentar e, muitas vezes, são forçados a migrar para áreas urbanas.
No Brasil, esse processo tem sido bastante expressivo na região denominada Matopiba – que abrange parte dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia –, que vem sendo considerada a nova fronteira agrícola do país. Mais de vinte empresas transnacionais atuam na região,
cultivando produtos como algodão, cana-de-açúcar, milho e soja.
Um dos maiores problemas dessa modalidade de apropriação de terras é que ela nega às
populações locais o acesso à terra e aos recursos naturais fundamentais à sua sobrevivência.
A apropriação das terras agrícolas por empresas multinacionais e países estrangeiros está
relacionada a uma série de fatores que impactam diretamente a população rural dos países mais
pobres e em desenvolvimento.
As commodities
O comércio mundial de produtos agropecuários abrange tanto os produtos alimentícios (cereais, frutas, carne, laticínios etc.) como as ma térias-primas para a indústria e o setor energético. Essa comercialização acontece principalmente na forma de commodities, cujos preços são esta belecidos em escala internacional nas bolsas de mercadorias, como as de Chicago e Nova York, nos Estados Unidos, e Londres, no Reino Unido. A variação dos preços das commodities reflete em toda a economia, já que são matérias-primas usadas para a fabricação de diversos produtos. Em caso de elevação, os alimentos ficam mais caros, prejudicando os con sumidores – especialmente a população mais pobre, que, em geral, desti na grande parte de seu rendimento para a aquisição de alimentos. O mercado mundial de commodities é controlado por um restrito conjunto de trading companies, que são, principalmente, transnacio nais. Elas têm grande poder, influenciam a formação de preços no mer cado internacional, o valor dos fretes marítimos para transportá-las etc.
No Brasil, as tradings de commodities atuam na comercialização de soja, milho, açúcar, café, algodão e outros produtos e, nos últimos anos, têm atuado na aquisição de usinas de açúcar e etanol e no financiamento de sementes, agrotóxicos e fertilizantes para o agronegócio. Países que são grandes exportadores de produtos agropecuários, mas não se destacam como produtores e exportadores de produtos industrializados, estão mais suscetíveis e vulneráveis à oscilação dos preços das commodities. Essa característica se aplica principalmente aos países em desenvolvimento, bem como aos emergentes, que em geral são economias dependentes da produção e da exportação de commodities, como é o caso do Brasil.
Uso da terra e indústria de alimentos
O uso da terra em diversos países é influenciado pelo mercado internacional de commodities agropecuárias. Áreas que eram usadas para produção de alimentos tradicionais, visando atender às necessidades de suas populações, foram substituídas pela agricultura comercial, voltada à produção de commodities para o mercado externo. No Brasil, por exemplo, além desse fato, deve-se considerar que a expansão da fronteira agropecuária em direção ao Cerrado e à Floresta Amazônica, nas Grandes Regiões Centro-Oeste e Norte, ocorreu tam bém pela grande procura por essas commodities nos mercados interno e externo – soja, algodão, milho, carne etc.
O comércio mundial de commodities agropecuárias destina-se, sobretudo, ao abastecimento da indústria de alimentos, e não à venda in natura. A indústria as transforma em diversos produtos, os chamados alimentos industrializados – enlatados, empacotados, engarrafados etc. –, que são comercializados junto à crescente população urbana. Daí de corre a importância da agropecuária para a sociedade urbano-industrial.
Nas cidades, então, a obtenção de produtos alimentícios é realizada principalmente por meio de relações comerciais mediadas pelo dinhei ro, isto é, os produtos são comprados por quem possui poder de compra; diferentemente, portanto, de relações no campo, onde o produtor pode plantar ou criar animais para o seu próprio sustento e da sua família e comercializar o excedente. O crescimento populacional e a urbanização, por conseguinte, têm exigido aumento da produção agropecuária, que tem ocorrido com apoio do desenvolvimento científico e tecnológico aplicado à produção rural.
Desigualdade mundial de acesso a alimentos
Apesar dos avanços científicos e tecnológicos, a população mundial, em pleno século XXI, ainda sofre com a desigualdade de acesso aos ali mentos ou com a insegurança alimentar – situação em que pessoas não têm acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas, geran do desnutrição e fome. Segundo a FAO, a produção de alimentos no mundo é suficiente para atender às necessidades de 2500 quilocalorias e 65 gramas de proteí nas por dia a toda a população mundial. No entanto, em 2020, cerca de 768 milhões de pessoas, aproximadamente 10% da população mundial, foram dormir todas as noites sem ter ingerido alimentos em quantidade e qualidade suficientes para manter a saúde (consulte o quadro A). De acordo com o relatório Níveis e tendências da mortalidade infantil (2021), publicado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), no mundo, cerca de 13,7 mil crianças entre 0 e 5 anos de idade morreram, em média, a cada dia de 2020, o que correspondeu a 5 milhões.
A maioria dessas crianças poderia ser salva se elas tivessem as condições mínimas de alimentação adequada e os cuidados médicos e sanitá rios básicos. As mortes dessas crianças não apontam como causa direta a fome ou a desnutrição, mas sim a desidratação, a tuberculose, a pneu monia, o sarampo, a malária e outras doenças, que, ao se instalarem em organismos debilitados em decorrência da desnutrição, causam óbitos, o que é menos provável em crianças bem alimentadas.
Causas da insegurança alimentar
Não há apenas uma causa ou fator particular que explique a fome ou a desnutrição no mundo, mas sim um conjunto deles, em que se destacam: • as guerras e os conflitos internos em países, que inclusive dificul tam ou impedem que a ajuda humanitária e alimentos cheguem ao seu destino;
• o desperdício de alimentos, desde o transporte até o consumo pe las famílias, pelos restaurantes, pelas lanchonetes etc., que pode riam alimentar aqueles que não têm possibilidades de adquiri-los;
• as mudanças climáticas que afetam a produção da agropecuária em determinadas áreas, comprometendo o abastecimento de alimentos;
• a substituição de produtos alimentares in natura pelos industriali zados, que, ao ficarem mais caros, geralmente limitam sua compra pelas pessoas mais pobres;
• a substituição da agricultura de produtores alimentares pela agri cultura comercial de exportação, como estudamos anteriormente. Entretanto, a principal causa da desigualdade de acesso aos alimentos ou recursos alimentares é a pobreza em que vivem milhões de pessoas em todo o mundo, tanto nas áreas rurais como nas urbanas. A existência da fome no mundo, ainda nos dias atuais, é uma situação vergonhosa para toda a humanidade.
A agricultura urbana
Há alguns anos vem se tornando comum a prática da agricultura urbana. Com ou sem apoio dos órgãos de administração pública mu nicipais, grupos de pessoas de comunidades urbanas estão se aprovei tando de terrenos ociosos ou sem construções para o plantio de frutas e a criação de animais de pequeno porte. Já implantada em várias cidades do Brasil, essa prática possibilita a ampliação do acesso a alimentos a quem precisa, além de permitir trocas, doações e comercialização. Assim, cumpre não só o objetivo de melhorar a alimentação, como também, no caso da comercialização, de aumentar o rendimento de quem necessita para que possa adquirir produtos de primeira necessidade.
Agropecuária e problemas ambientais
A agropecuária é fundamental para a sobrevivência humana e para a ma
nutenção do modo de vida atual. No entanto, algumas formas de produção,
como a agropecuária intensiva, quando não são acompanhadas de projetos
que considerem a preservação do meio ambiente e do ser humano, podem
comprometer o equilíbrio socioambiental.
Um dos problemas que têm de ser enfrentados é a quantidade de agrotóxicos e fertilizantes químicos usados na produção agrícola moderna. Esse uso
excessivo, em geral aprovado por governos, contribui para uma crescente contaminação do solo e das águas superficiais e subterrâneas, comprometen
do a fertilidade dos solos e causando problemas de saúde aos trabalhadores
do campo e aos consumidores desses produtos.
Um contraponto importante a esse modo de produção e que tem crescido
no mundo todo é a agricultura orgânica ou biológica (como é conhecida em
países europeus), sistema de produção que não utiliza produtos químicos. Esse
modo de produzir é responsável por uma pequena parcela da produção agrí
cola do mundo, já que a maior parte dos grandes cultivos, como a cana-de-açúcar, o milho, o trigo, o arroz e a soja, é feita de forma intensiva e utiliza
produtos químicos em grande quantidade.
A maior parte das terras agrícolas está ocupada com pastagens para animais,
e alguns dos principais cultivos, que ocupam grandes extensões de terras,
existem para alimentar os animais e não os seres humanos (cerca de 70% do
milho cultivado no mundo, por exemplo, vai para alimentação animal). Além
disso, grandes extensões de terras são ocupadas por cultivos destinados à
disso, grandes extensões de terras são ocupadas por cultivos destinados à
produção de energia.
Nos Estados Unidos, o maior produtor mundial de milho, metade da pro
dução destina-se à alimentação de animais e cerca de um quarto vai para a
produção de álcool. No Brasil, a maior parte da produção de cana-de-açúcar
(o país é o maior produtor mundial) vai para a produção de álcool combustível
(etanol); em relação ao milho, o cultivo no Brasil destinado para alimentação
de animais, principalmente frangos e porcos, fica na média mundial.